Nem dificudades de Bolsonaro nem medidas pensadas para
melhorar popularidade do presidente conseguem levar o governo a retomar o
comando da agenda legislativa e política
Pela primeira vez em algum tempo, a direita e a extrema
direita brasileiras parecem desorientadas diante do agravamento da situação
judicial de Jair Bolsonaro e seu entorno. O surpreendente é que nem isso tem
sido suficiente para que o governo Lula, que já navega sem bússola há mais
tempo que seus opositores, encontre o rumo da retomada da agenda do país e da
popularidade perdida.
O presidente foi à Ásia e voltou, se fez acompanhar de todos
os responsáveis pelo andamento do Congresso e, ainda assim, não há garantia de
que conseguirá de novo assumir o comando da agenda legislativa, algo que não
tem desde o fim de 2023.
Lula tinha a faca e o queijo na mão para — depois de tanto
tempo de conversas ao pé do ouvido com Hugo Motta, Davi Alcolumbre e seus
antecessores, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco — voltar com a reforma ministerial
resolvida e a pauta de votações acordada. Mas o que os viajantes encontraram
foi uma pressão do PL pela votação da anistia para os condenados do 8 de
Janeiro, que está longe de ser um clamor popular e interessa apenas a Bolsonaro
e aos seus.
O presidente da Câmara tem resistido no
limite de alguém que contou com apoio de gregos e baianos para se eleger, como
diria o mestre Gilberto Gil. Não quer de jeito nenhum avançar com essa matéria,
mas também não quer se indispor com a maior bancada da Casa logo na largada de
sua gestão.
Se o governo fosse forte no Parlamento, seria mais fácil
cerrar fileiras com o Centrão e simplesmente passar o trator em cima dos que
defendem a anistia, virar essa página e começar, finalmente, a discutir as
matérias econômicas, estas sim prioridades dos brasileiros.
Se Motta tiver pulso, esse deve ser seu discurso a partir
desta quarta-feira, quando a birra dos bolsonaristas por uma anistia para os
seus baterá de frente com a urgência de o Brasil ter um instrumento para
responder ao tarifaço de Donald Trump.
Sim, a maré da direita também não é das melhores, porque o
inferno astral de Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal coincide com a
constatação, óbvia, de que aqueles que se empolgaram e vestiram o boné com os
dizeres “Make America Great Again” agora veem seu chapa adotar uma série de
medidas que serão extremamente prejudiciais ao Brasil, com setores que apoiaram
Bolsonaro, como o agronegócio, entre os mais atingidos.
O resultado foi a rara união de esforços entre governistas e
oposicionistas no Senado neste início de semana, com a aprovação a jato do
projeto que dá ao país instrumentos para adotar alguma reciprocidade em caso de
tarifas arbitrárias partindo dos Estados Unidos. A Câmara, agora, pode se unir
a esse esforço de responder às ameaças à economia nacional ou ficar emperrada
por causa da birrinha dos bolsonaristas — nada que dê muito Ibope para o
ex-presidente e seus estridentes apoiadores na guerrilha digital pela qual
costumam dar a vida.
Quem esperava que o simples alinhamento ideológico com Trump
fosse um trunfo para Bolsonaro se contrapor ao avanço das investigações e,
agora, do processo contra si na Justiça brasileira assiste meio atônito à
rápida constatação de que sua guerra comercial tendo o Brasil como um dos alvos
também atingiu em cheio esse discurso para a plateia.
O curioso é que nem essa maré de desventuras para a família
Bolsonaro e os seus seguidores se reverte, até aqui, em melhora na sorte de
Lula. Novas pesquisas continuam apontando queda na popularidade do presidente,
cuja caixa de ferramentas de medidas para tentar acertar o coração e o bolso
dos eleitores já foi aberta e começa a se mostrar esgotada.
O presidente tem, no enfrentamento aos abusos de Trump, mais
uma chance de unir o Centrão em torno de seu mandato, mas falta a ele
capacidade resolutiva e atratividade, mesmo quando o adversário abre a
retaguarda e permite o contra-ataque.
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