O pacote de apoio aos atingidos pelo tarifaço fez o
governo reformar o sistema de financiamento à exportação, para chegar à pequena
empresa
O difícil equilíbrio que o governo buscou na resposta à
crise provocada pelo tarifaço foi adotar medidas que efetivamente ajudassem o
exportador afetado, mas que tivessem baixo impacto fiscal. Havia outro desafio
que o governo se impôs, o de deixar alguma herança em mudanças estruturais.
Para isso, reformou o sistema de financiamento à exportação, tornando-o mais
ágil e capaz de chegar às empresas pequenas. Estabeleceu prazos para que o
subsídio não se eternize, como sempre acontece.
O tripé, que
antecipei ontem no meu blog, de apoio ao exportador é crédito, impostos e
compras governamentais. Os fundos de exportação receberão aportes, porém mais
importantes serão as mudanças na estrutura dos fundos, se elas funcionarem. O
que o governo promete é fazer chegar esse dinheiro às micro e pequenas empresas
também, e não apenas às grandes. Para dar uma ideia do desafio, o secretário do
Tesouro, Rogério Ceron, disse que as micro e pequenas empresas respondem por
apenas 1% do acesso ao crédito à exportação. Na Índia e na Coreia chega a 40%,
na Itália, 30%. “No Brasil, o sistema não colabora”. A mudança é bem-vinda,
caso atinja o objetivo.
O Reintegra é um programa controverso. Ele se propõe a ser
uma forma de o governo retirar tributos que tenham permanecido no produto
exportado. Muitas vezes serviu como um disfarçado subsídio à exportação. Sair
de 0,1% para 3% do valor exportado para as grandes empresas, e de até 6% para
as pequenas, pode ter um custo alto. Ele terá validade até o fim de 2026. O
diferimento dos impostos, ou seja, o adiamento do pagamento, será por apenas
dois meses e tem custo bem residual, apesar de dar um fôlego imediato às
empresas afetadas. O novo prazo para o drawback também parece uma boa medida: o
exportador terá um ano para usar o crédito dos impostos pagos na importação de
insumos.
Entrevistei na GloboNews o ex-secretário do Tesouro, Bruno
Funchal, atualmente diretor-presidente da Bradesco Asset, e perguntei sobre a
necessidade dessas medidas de resgate e os cuidados que o governo deve ter. Ele
não teve dúvidas em afirmar que as iniciativas são necessárias, só é preciso
ter prazo para terminar.
— É óbvio que aconteceu o imprevisível e afetou a economia.
Para alguns setores, o impacto é significativo. Então ter algum tipo de ajuda
temporária faz sentido. Isso inclui postergação de impostos, crédito, medidas
para sustentar o emprego. O pacote faz sentido. Mas o maior desafio é saber
quando termina, para que o benefício não se propague indefinidamente, como
aconteceu lá atrás com algumas medidas da pandemia.
Funchal sustenta o que tem sido dito por outros economistas:
do ponto de vista macro, o impacto não é grande no Brasil. Uma perda de 0,2% do
PIB, uma queda de exportação de US$ 6 bilhões. Antes das exceções, o cálculo
era de US$ 12 bilhões. E um efeito baixista na inflação. Ela tenderá a
desacelerar mais do que já estava caindo. Na economia americana, contudo, o
efeito da alta taxação contra o mundo já está sendo sentido.
— Antes do tarifaço, o núcleo da inflação americana estava
convergindo mais ou menos para a meta, que é de 2%. A gente vê agora uma volta,
se aproximando dos 4%. Um impacto relevante em preço e uma criação menor de
empregos. A expectativa de geração de emprego era muito maior do que aconteceu
— disse Bruno Funchal.
A tarifa média dos EUA era de 2,4%, hoje é 17%. O número
representa um retrocesso de quase um século na história do comércio
internacional norte-americano. Mais do que isso, o país se colocou num enorme
isolamento. Os Estados Unidos pagarão um preço.
Em relação ao Brasil, a escalada dos absurdos cometidos por
eles continua. Relatório de direitos humanos mentiroso, perseguição a
funcionários públicos, imposição da maior tarifa do mundo. Uma situação
“inusitada", como disse ontem o ministro Fernando
Haddad.
— O Brasil é um país que está sendo sancionado por ser mais
democrático do que o seu agressor — disse o ministro.
O pacote de ontem foi a resposta necessária e urgente na
economia. Mas a diplomacia não pode descansar. Em algum momento haverá uma
brecha racional. O Brasil tem que ter um cardápio de propostas a oferecer
quando houver negociação sobre comércio. Como disse ontem na coletiva o
secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Márcio Elias Rosa, “a
soberania nunca esteve sobre a mesa e nunca estará”.


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