Problema é político, com reflexos no mundo do Direito, e
não o contrário, porque, juridicamente falando, não há para onde correr
Muito tem se falado sobre os efeitos da Lei Magnitsky nas
últimas semanas. Sua essência reside na imposição de sanções a indivíduos e
entidades estrangeiros considerados responsáveis por violações graves de
direitos humanos ou atos de corrupção significativos.
Um ponto central é a natureza da decisão de aplicar as
sanções. A inclusão do nome de qualquer pessoa na lista da Lei Magnitsky é um
ato privativo do presidente dos Estados Unidos, com base no interesse nacional.
Portanto, sua legitimidade está ligada somente à ordem jurídica americana.
As sanções são aplicadas primariamente
dentro do território americano: bloqueio de bens e ativos sob a jurisdição dos
Estados Unidos e proibição do acesso dos indivíduos sancionados a seu sistema
financeiro e ao país (banimento de vistos). No entanto o alcance do dólar e do
sistema financeiro americano no mundo faz com que essas limitações tenham um
efeito cascata. Bancos, empresas e prestadores de serviços de qualquer país que
queiram manter relações com os Estados Unidos ou usar suas moedas e plataformas
financeiras são compelidos a seguir as sanções, sob pena de também ser
sancionados.
Essa dinâmica levanta discussões sobre a soberania de outras
nações. Politicamente, a Lei Magnitsky é uma forma de coação e pressão,
projetando o poder americano para influenciar a conduta de atores estrangeiros.
Juridicamente, todavia, não há violação de soberania. Os Estados Unidos não
obrigam outro país a mudar suas leis ou a adotar suas políticas. Apenas
estabelecem as regras para quem deseja operar em seu território ou fazer uso de
seu sistema financeiro. Essa prerrogativa é manifestação da soberania de cada
nação, que pode definir as condições para a entrada de pessoas e a realização
de negócios em seu território.
Considerando o ordenamento jurídico brasileiro, a aplicação
da Lei Magnitsky não viola nenhuma lei nacional. Isso porque a decisão de uma
empresa brasileira ou da filial de uma empresa americana no Brasil de se
adequar às sanções americanas é uma escolha estratégica de negócios. É ditada
pela necessidade de manter acesso ao mercado americano e ao sistema financeiro
global.
A partir desse entendimento, uma determinação judicial no
Brasil para impedir o encerramento desses contratos seria inconstitucional. A
Constituição brasileira garante, em seu artigo 170, o princípio da
livre-iniciativa, um dos fundamentos da ordem econômica. Obrigar uma empresa a
manter um contrato contra sua vontade, seja a que título for, destruiria a
própria noção de formação de um negócio, já que seu nascimento se dá a partir
da combinação de vontades de realizar algo.
Portanto, ao analisar a Lei Magnitsky, é importante ter em
mente que se trata de problema político com reflexos no mundo do Direito, e não
o contrário, porque, a rigor, juridicamente falando, não há para onde correr.
Por isso ela se torna um instrumento tão poderoso, que deve ser combatido no
campo político, onde há espaço para negociação e diálogo, sem perder a firmeza
para que possamos resguardar nossos interesses.


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