Trocar anistia por redução de pena é dar novo nome a acordão
para salvar golpistas
Temer e Aécio ressurgem em negociação com ministros do
STF para livrar Bolsonaro da cadeia; Paulinho da Força volta ao papel de
laranja da impunidade
Entrou em cena uma nova articulação para tentar salvar Jair
Bolsonaro da cadeia. A ideia é trocar o projeto da anistia por outro de redução
de penas. Na prática, o efeito pode ser o mesmo: livrar o capitão de ser preso
em regime fechado.
A manobra começou a ser desenhada na casa do ex-presidente
Michel Temer, que reapareceu no noticiário como lobista do encrencado Banco
Master. Estavam presentes os deputados Aécio Neves, gerente da massa falida do
PSDB, e Paulinho da Força, recém-nomeado para relatar o projeto da anistia.
Na saída do encontro, o chefão do Solidariedade pediu que o
texto passe a ser chamado de projeto da dosimetria. Sem corar, ele explicou que
vai propor mudanças na lei para favorecer criminosos condenados por tentativa
de golpe. “O Brasil não aguenta mais essa polarização”, justificou.
Se a proposta colar, as condenações não
serão anuladas, mas as punições ficarão bem mais brandas. No caso de Bolsonaro,
será preciso criatividade para diminuir a pena de 27 anos de prisão. Fundir os
crimes de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito,
como já se ensaiou, só descontaria seis anos e meio de cana.
Ao fim da reunião, Temer se disse empenhado em “pacificar” o
país. A palavra não diz nada, mas tem mil e uma utilidades. Já foi recitada
quando ele assumiu a Presidência após articular a derrubada da antecessora, em
2016, e quando ajudou a salvar Bolsonaro da ameaça de impeachment, em 2021.
Nove anos atrás, o pacificador prometeu um governo de
“salvação nacional”. Como sempre, queria salvar a pele dos aliados. Na época,
tramava-se uma anistia para Eduardo Cunha, acossado por acusações de corrupção.
O laranja escalado para defender a proposta, veja só, foi o deputado Paulinho
da Força.
Se a anistia de Cunha não saiu, a de Bolsonaro ainda pode
emplacar. A novidade da conversa desta quinta foi a participação de dois
ministros do Supremo. Por telefone, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes ouviram
a proposta e sinalizaram disposição para negociar. Fora dos autos, é claro.
Em vídeo divulgado por Paulinho, o ex-presidente falou em
“momento histórico” e “pacto republicano” — outra expressão maltratada pelo uso
abusivo. “De comum acordo com o Supremo Tribunal Federal e com o Executivo”,
acrescentou, esfregando as mãos.
A fala fez lembrar o “pacto” sugerido por Romero Jucá para
frear a Lava-Jato num “grande acordo nacional”. “Com o Supremo, com tudo”,
sugeriu o então senador. Jucá escapou da Justiça, mas não conseguiu renovar o
mandato nas urnas. Hoje atua formalmente como lobista nos gabinetes de
Brasília.
Anistias e acordões integram a paisagem nativa desde que o
Brasil era colônia. Fazem parte de uma tradição de conchavos pela impunidade
das elites, que assim se protegem da aplicação da lei. Temer e Aécio têm larga
experiência no assunto. A ver se os ministros do Supremo, que condenaram
Bolsonaro há apenas dez dias, aceitarão participar dessa jogada.


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