Com anistia e blindagem, deputados vivem surto legislativo
em causa própria
Votações a toque de caixa mostram força de aliança do
Centrão com bolsonarismo
Após meses sem votar propostas relevantes, a Câmara teve um
surto legislativo em causa própria. No intervalo de 24 horas, aprovou a PEC da
Blindagem e fez avançar o projeto de anistia aos golpistas.
A emenda muda a Constituição para elevar os parlamentares à
condição de intocáveis. Eles só poderão ser processados com autorização da
Câmara ou do Senado. Na prática, a regra cria um salvo-conduto para a prática
de crimes. O deputado ou senador que burlar as leis não precisará mais se
preocupar com a Justiça. Bastará contar com o corporativismo dos colegas, que
poderão salvá-lo no escurinho do voto secreto.
O projeto de anistia abre caminho à
impunidade de quem conspirou contra a democracia e tentou dar golpe para impor
uma nova ditadura. O texto não está fechado, mas tem potencial para livrar toda
a camarilha. Do ex-presidente condenado a 27 anos de prisão aos seguidores que
invadiram e depredaram os palácios em seu nome.
As duas propostas avançaram a toque de caixa, sem passar por
comissões ou audiências públicas. A via expressa foi pavimentada pela aliança
do Centrão com a extrema direita. A tabelinha ainda teve o reforço de deputados
que se dizem de esquerda. Só o PT deu 12 votos a favor da PEC da Blindagem, a
pretexto de criar condições para um acordo contra a anistia.
O petista Valter Pomar batizou o grupo de “centrãozinho do
PT”. Nele desfilam o vice-presidente da sigla, Jilmar Tatto, e o ex-líder Odair
Cunha, que sonha com uma cadeira no Tribunal de Contas da União. Não terá o
cargo vitalício e arrisca ficar sem a reeleição em 2026.
Defensores da PEC alegam que ela restaura o texto original
da Constituição de 1988. O argumento é duplamente enganoso. Na época, o país
saía de uma ditadura que fechou o Congresso e cassou 181 deputados e senadores.
Os constituintes queriam proteger os parlamentares do autoritarismo, não
transformá-los numa casta acima da lei.
A prática mostrou que a regra criada para preservar a
imunidade virou garantia de impunidade. Em 13 anos, Câmara e Senado barraram a
abertura de 253 processos criminais. Só um deputado virou réu: o rondoniense
Jabes Rabelo, acusado de receptação de veículo roubado. No Congresso de hoje,
ele seria considerado um ladrão de galinhas.


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