Um ex-delegado-geral de São Paulo é assassinado pelo PCC em
Praia Grande, São Paulo. Deputados votam a PEC da Blindagem para não ser presos
ou processados sem a autorização dos pares. Barcos de guerra e submarino
americanos navegam no Caribe, diante da Venezuela.
São três fatos que não parecem ter relação. Mas, na cabeça
de um velho morador do Rio, eles se enlaçam harmoniosamente a ponto de
despertar o alarme: o Brasil corre o risco de se transformar num narcoestado
com profundas implicações para a segurança nacional.
O assassinato do delegado Ruy Ferraz Fontes acontece algumas
semanas depois de a polícia detectar a infiltração financeira do PCC. Como
lembra Raul Jungmann, já não se vive mais o tempo de segurança pública em que o
alvo da polícia eram comunidades pobres. O crime estava enraizado na Faria
Lima, coração do mercado financeiro.
Se aprovada, a PEC da Blindagem tornará o Congresso um lugar
mais atraente para o crime organizado. Isso para quem vive no Rio é mais que
evidente. Há poucos dias foi preso o deputado TH Joias exatamente por ligação
íntima com o Comando Vermelho.
A pergunta mais importante é esta: o Brasil tem condições de
reverter esse quadro? A luta contra o crime organizado revela lacunas
perigosas: não só testemunhas são assassinadas pelo PCC em aeroportos, como os
próprios policiais que o investigam são alvos fáceis da organização.
Recentemente, os Estados Unidos propuseram ao Brasil
classificar o tráfico de drogas como terrorismo. O país recusou com base em sua
legislação. Aqui, a lei antiterrorista chegou um pouco tarde. Durante muito
tempo, o Brasil hesitou por achar que ela poderia atingir movimentos sociais.
Tornou-se obrigatória para que houvesse Olimpíada.
Mesmo sem coincidir com a proposta americana, um estudo
sobre o combate à Máfia poderia ser grande inspiração. Houve um trabalho
articulado de repressão policial, legislação adequada e investimentos.
O Brasil pode dar o primeiro passo com a PEC da Segurança
Pública. Mas está demorando muito. Por meio dela, é possível considerar o crime
organizado um desafio nacional. Nos Estados Unidos, o FBI também relutou em
reconhecer o problema.
Dois marcos fundamentais, além da responsabilidade nacional:
uma lei que permita atacar organizações criminosas como entidades e um programa
de proteção às testemunhas. Este último, temos no Brasil. Mas carece de
credibilidade quando se vê o assassinato de um delegado que combatia o PCC.
No combate à Máfia, além de gravações elucidativas, o FBI
conseguia se infiltrar. A infiltração é uma tática válida, mas depende de alta
qualidade profissional. Sempre sob liderança nacional, o desmonte da Máfia não
foi uma operação única e bombástica, mas um processo gradual, envolvendo
Justiça e polícia.
Tudo isso deveria ser discutido com urgência num Parlamento
que prefere abrir novos flancos ao crime. Nem a responsabilidade federal foi
aceita. Lembro-me do início do século, quando fazíamos mapas mostrando a
ocupação do Rio pelo tráfico e a milícia. Pensávamos que isso ajudaria. O
domínio territorial se expandiu, o crime avançou, a organização policial foi
devastada pelos problemas da própria cúpula do governo. Quase todos os
governadores foram presos.
Os navios nacionais deveriam nos cercar para evitar que, no
futuro, outras bandeiras tremulem no cerco.
Artigo publicado no jornal O Globo em 23 / 09 / 2025


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