O ano que acaba trouxe algumas surpresas. Uma delas foi a
suposição de que Donald Trump seria um ator importante na política brasileira.
Ele escreveu uma carta condenando o julgamento de Bolsonaro e, em seguida,
decretou o tarifaço, suspendeu vistos de ministros, enquadrou Alexandre de
Moraes na Lei Magnitsky. Meses depois, quase tudo isso estava revogado e as
relações entre Brasil e Estados Unidos entraram na normalidade. Foi uma vitória
do presidente Lula e da diplomacia brasileira. E uma grande derrota para o
bolsonarismo, que depositava em Trump suas últimas esperanças. Não foi uma
simples derrota porque o movimento de Eduardo Bolsonaro apoiando o tarifaço já
havia desgastado sua corrente política com a opinião pública brasileira. O
resultado de tudo isso foi o fortalecimento de Lula, que já vinha recuperando
sua popularidade e agora desponta como favorito nas eleições de 2026.
Se de um lado essa variável parece mais ou menos definida,
por outro, o futuro do País continuará complicado. Há uma crise profunda entre
Congresso, governo e Supremo Tribunal Federal (STF) e poucos indícios de que
isso possa ser resolvido em curto prazo.
O Congresso, mesmo renovado – o que seria uma grande vitória
–, não vai abrir mão de deter grande parte do Orçamento. Desde a vitória de
Severino Cavalcanti ficou claro que os presidentes da Câmara e mesmo do Senado
não seriam eleitos de forma tradicional. Não representam necessariamente uma
corrente política e uma visão de Brasil. Precisam ser hábeis articuladores de
interesses fisiológicos.
Diante desse quadro, o movimento principal será sempre o de
obter mais verbas e reduzir ao máximo a transparência. Uma grande esperança de
correção dos desvios do Congresso é o STF. Desde a presidência de Rosa Weber há
uma tentativa, continuada agora com Flávio Dino. Mas o próprio STF vive uma
crise particular. Sua origem talvez tenha sido quando a Corte abriu o inquérito
sobre as fake news. Naquele momento, o alvo era também a Receita
Federal, que fiscalizava as mulheres de Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que era
presidente do Supremo. Toffoli designou Alexandre de Moraes para conduzir o
inquérito. O problema subjacente é o seguinte: os ministros consideraram que
seus parentes podem advogar e que isso não representa um impedimento para
julgá-los.
Esse problema foi ofuscado pela luta contra a extrema
direita, que trouxe ao STF um alto nível de reconhecimento na opinião pública.
Toffoli liquidou os processos da Lava Jato e perdoou multas bilionárias da JBS.
Nesse momento, assumiu o caso Master e decretou um pesado sigilo, inclusive
diante do pedido de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Moraes, por
sua vez, foi alcançado pelo caso Master, por meio da divulgação de um contrato
entre sua mulher, Viviane, e o banco. O contrato previa uma remuneração mensal
de R$ 3,6 milhões num total de R$ 129 milhões em três anos.
Tudo isso acontece num momento em que se fala sobre um
código de ética para o Supremo. De um modo geral, o movimento foi suscitado
pelas notícias de viagens dos ministros para conferências em Nova York e
Londres, por exemplo, com diárias em hotéis caros pagas por empresas com
interesses no Supremo.
Diante da advocacia de parentes, parece que as viagens são
secundárias. Sobre isso não se fala. O clima de que o governo Lula prepara sua
presença até 2030 é de ceticismo em parte da opinião pública. O próprio governo
foi muito criticado no escândalo do INSS, embora os desvios que vitimaram os
aposentados tenham acontecido também em outros governos.
Todo esse quadro que se configura no fim de 2025 torna o ano
seguinte problemático, pois não há no horizonte eleitoral esperança de solução
para os problemas. O que se pode desejar é uma renovação moderada do
Parlamento, mas, ainda assim, incapaz de deter a marcha dos fisiologismos na
conquista de grande parte do Orçamento.
O interessante é que, ao contrário de outros países do
continente, a experiência populista de direita, com mágicas promessas de uma
nova política, já aconteceu em 2018 e chega ao seu ponto crítico com a prisão
de Bolsonaro e as desastradas manobras junto a Trump.
Uma saída para essa crise da democratização exigirá muito
debate e, sem dúvida, é o grande desafio de 2026 que não se esgotará na eleição
presidencial.
Enquanto o ceticismo perdurar, o País estará vulnerável ao
fascínio dos aventureiros. Mas, em compensação, pode aceitar novas propostas
ou, no mínimo, se mostrar mais exigente com os governantes que queiram apenas
continuar, sem perceber a dimensão da crise do processo que se iniciou com a
campanha das diretas, mas ainda está em dívida com as grandes expectativas da
democratização.
De lá para cá, a democracia apenas sobrevive. A campanha
eleitoral, uma das mais caras do Ocidente, resultou num processo de corrupção
sem precedentes. Hoje, o País destina R$ 5 bilhões aos partidos para que façam
a campanha. É uma fortuna para que se produza muito pouco de novo. Muito
dinheiro para pouca esperança.
Artigo publicado no jornal Estadão em 19 / 12 / 2025


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