É preciso dar ao crescimento econômico o mesmo peso
destinado ao controle da inflação
A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária
(Copom) do Banco Central não indicou início de redução de juros para janeiro.
Há duas hipóteses: ou bem a autoridade monetária não quer se antecipar,
evitando ficar a reboque do mercado, ou segue influenciada por uma ideia de que
caberia ser durão, por mais tempo, a fim de ganhar a confiança dos mercados.
O argumento do Banco Central para manter a Selic em 15% ao
ano, equivalente a um nível real de juros de 11%, baseia-se em três pontos: a
lenta convergência das expectativas de inflação à meta de 3% ao ano; a projeção
de inflação superior à meta para o chamado horizonte relevante; e a atividade
econômica ainda forte.
A pesquisa Focus, que reúne as projeções
econômicas dos agentes do mercado, já aponta, por cinco semanas consecutivas,
redução na mediana das estimativas para a variação do Índice Nacional de Preços
ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2025 e 2026. Na apuração da última segunda-feira,
as medianas das projeções para 2025 e 2026, respectivamente, eram: 4,36% e
4,10%. Para 2027, 3,80%.
Na pesquisa Focus de 7 de março, as projeções para 2025,
2026 e 2027 eram as seguintes: 5,68%, 4,40% e 4,00%, respectivamente.
Evidentemente, essa mudança expressiva nas estimativas de inflação em 2025 está
associada à taxa de câmbio. O Brasil possui uma conta capital e financeira, no
balanço de pagamentos, bastante aberta. Isso conduz a uma volatilidade
gigantesca na taxa de câmbio. A saber, o diferencial de juros continua a
afetar, fortemente, as entradas e saídas de capital, movimento que se convencionou
chamar de carry trade, quando o dinheiro é captado em países com taxas de juros
baixas e trazido para países com juros estratosféricos.
Vale dizer, o Banco Central projeta que a inflação ficará
muito próxima de 3% no horizonte relevante da política monetária, isto é, nos
idos da primeira metade de 2027. A pesquisa Focus, como vem ocorrendo há
semanas, deve começar a refletir essa convergência da inflação do ano que vem
para patamares ainda mais baixos, o que vai ensejar considerações sobre as
estimativas para 2027.
A taxa de câmbio não deve sofrer sobressaltos, em 2026,
mantendo-se em nível favorável e, a depender da política econômica
norte-americana (juros e tarifas), pode até passar por novas reduções (isto é,
subidas do real frente ao dólar). Esse é um fator preponderante.
Quanto à atividade econômica, os dados mais recentes do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do próprio Banco
Central indicam uma murcha. O Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre
aumentou apenas 0,1%, depois de alta de 0,3% no segundo, e de 1,5%, no
primeiro. As projeções para o PIB estão pouco acima de 2% para 2025. No ano que
vem, já se projeta PIB mais próximo de 1,5%. Vai ser preciso derrubar ainda
mais as projeções de PIB para os juros se movimentarem?
A política monetária pode levar tempo, mas afeta a demanda
da economia. Os indicadores de indústria, serviços e comércio estão apontando
na mesma direção. Cabe ao Banco Central não ignorar a realidade, sob a ideia de
que precisaria angariar credibilidade ou coisa assim.
A hora é de olhar para o risco de uma deterioração da
atividade econômica, que poderá vir como uma avalanche, dados os efeitos
acumulados dessa política monetária excessivamente conservadora. A redução dos
juros precisa começar logo e, mesmo assim, a política monetária ainda operará
em níveis contracionistas por boa parte do ano que vem.
A ideia de que o Banco Central precisa ser durão é uma
falácia. À autoridade monetária cabe buscar a preservação do valor da moeda e o
bom funcionamento do sistema financeiro. Cabe controlar a inflação, perseguindo
as metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional. Metas que, atualmente,
estão completamente fora da realidade. Quem disse ser prudente ou tecnicamente
recomendável para a economia brasileira uma inflação de 3% ao ano?
Mesmo que não exista, no Brasil, o chamado duplo mandato
para a autoridade monetária – metas de inflação e minimização do hiato do
produto ou do emprego –, é dever do Banco Central acompanhar a atividade
econômica e o emprego e cuidar para que suas decisões não acabem desprezando o
bebê junto com a água suja do banho.
Ademais, uma política monetária conservadora gera despesas
com juros impeditivos. O déficit do setor público está em 8,2% do PIB, sendo o
resultado primário próximo de zero e o restante explicado pelos gastos
financeiros. Como estabilizar uma dívida que recebe mais e mais lenha na
fogueira?
A busca do superávit primário é inescapável, mas não anula a
necessidade de uma revisão na política monetária. Gostamos muito de copiar os
Estados Unidos, mas, curiosamente, nesse tema, não. O duplo mandato e a
sinalização de uma curva de juros projetada (e não apenas do juro de curto
prazo) pelos membros do Fomc (o Copom americano) são providências que poderiam
ser copiadas por aqui.
O Banco Central quer ser durão. Para quê? A credibilidade da
atual gestão já está provada. Trata-se de gente séria, como já mostrei aqui. É
preciso dar ao crescimento econômico o mesmo peso destinado ao controle da
inflação. Nisso, ainda engatinhamos. •


Nenhum comentário:
Postar um comentário