Articulação dos Povos Indígenas do Brasil vê pontos
preocupantes no voto do relator
Ministro criou muitas condicionalidades para os direitos
indígenas
"Estão matando os índios guaranis do sul do Mato Grosso
(...) Os jovens índios, quando abrem os olhos para o mundo em que lhes cumpre
viver, se matam às dezenas. Suicidam-se. Mas na verdade são mortos pelo
desprezo vil dos invasores de suas terras."
Foi assim, contundente, que Darcy Ribeiro iniciou seu artigo
na Folha em 1996, republicada agora como uma das 105 colunas de maior impacto.
Trinta anos depois, o texto continua atual.
O vaivém do marco
temporal para demarcação de terras indígena entre o Senado e o STF pode ser,
por um lado, lido como mais uma história de embate entre o Congresso, que tem
há anos adotado política antiambiental e anti-indígena, e o STF, que formou
maioria nesta quarta (17) contra o marco temporal. A realidade, no entanto, é
mais complexa: a história inclui o vaivém do próprio Supremo, por culpa
própria, na proteção de indígenas.
Segundo a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil),
há pontos preocupantes sobre o voto do relator Gilmar Mendes.
O ministro fragiliza a segurança fundiária de povos indígenas ao prever que
estes possam receber alternativamente outras terras "equivalentes às
tradicionalmente ocupadas" e ao limitar a cinco anos o prazo para que se
revise a extensão territorial de terras indígenas.
Pior: Gilmar Mendes cede a interesses poderosos. O relator
amplia a participação de estados, municípios e terceiros no processo de
demarcação, dando voz a interesses anti-indígenas locais; aumenta os casos de
exploração econômica em terras indígenas sem vetar as atividades de alto
impacto ambiental; prevê a indenização pelo valor da terra nua e pelas
benfeitorias como condição para a demarcação.
Depois de falhar, como já era esperado, em conciliar
invadidos e invasores, o voto do relator Gilmar Mendes do STF é nominalmente
contrário à tese do marco temporal, o que era o mínimo que se esperava diante
do precedente de 2023 em que a corte havia derrubado a tese.
Gilmar, no entanto, cria tantas condicionalidades para
direitos indígenas que, de fato, constitui um Marco Temporal 2.0.


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