Por Adriana Ferraz, Daniel Trielli e Edison Veiga, O Estado de S. Paulo
Vereadores de São Paulo usam verba de gabinete para pagar
aluguel de carro pelo dobro do preço oficial, comprar papel higiênico para
escritório político, contratar advogado em vez de recorrer aos 32 procuradores
da Câmara Municipal e encomendar brindes e homenagens para agradar seu
eleitorado. O Estado analisou cada uma das 7.960 notas fiscais apresentadas no
primeiro ano da atual legislatura e averiguou como cada parlamentar gasta os
recursos públicos.
Entre os pedidos de reembolso feitos em 2013 há também
recibo de lavagem de carros de luxo particulares, de material escolar - como
giz de cera e tinta guache -, flores e notas fiscais que indicam variação de
até 30% na compra de um mesmo produto dentro de 30 dias, como um litro de
combustível etanol. No ano passado, os 55 vereadores paulistanos foram
reembolsados em R$ 9 milhões para custear despesas de gabinete.
O levantamento mostra em detalhes como os parlamentares
fazem uso dos R$ 218 mil anuais a que têm direito. O resultado é que,
dependendo do vereador, boa parte dos gastos não segue o princípio do interesse
público nem a regra do menor preço, de acordo com a Lei de Responsabilidade
Fiscal.
Parlamentar novato, Masataka Ota (PROS), por exemplo, gastou
R$ 5,3 mil por mês com o aluguel de um Toyota Corolla. Por menos da metade do
preço, a Câmara oferece um Fiat Linea, ao custo mensal de R$ 2,6 mil - valor
obtido por meio de uma licitação. Ota, porém, argumentou que o valor que paga
pelo Corolla está abaixo do praticado no mercado.
Apesar de dispendiosa, a troca de veículo não é proibida
pela Casa, e o vereador que teve o gasto com um carro de luxo é reembolsado.
Masataka não é o único. Outros dez colegas preferiram escolher seus próprios
veículos e pagaram a mais por isso. Paulo Fiorilo (PT) é o único que locou um
carro e pagou menos: R$ 2,5 mil mensais por um VW Polo Sedan.
Contas de telefone dos escritórios políticos de Aurélio
Nomura (PSDB), Edir Sales (PSD) e Dalton Silvano (PV) também são pagas com
verbas de gabinete. No caso do vereador George Hato (PMDB), ele ainda paga
material de limpeza do imóvel onde seu pai, o deputado estadual Joogi Hato
(PMDB), atende seus eleitores. Entre as notas apresentadas por Hato, há sacos
de lixo, vassouras e até papel higiênico.
De acordo com o Regimento Interno da Câmara, conjunto de
regras elaboradas pelos próprios vereadores, gastos com lavagem de veículo e
pagamento de contas de escritórios não estão vetados. Mas, segundo o professor
de Ciência Política da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Marco Antonio Teixeira,
gastos com dinheiro do contribuinte devem atender ao interesse público.
A análise das notas, apesar disso, mostra que os recursos
municipais foram usados para pagar gastos privados. A BMW particular de Rubens
Calvo (PMDB), por exemplo, foi lavada dez vezes, ao custo que variou de R$ 30 a
R$ 180. O parlamentar considera o serviço necessário para manter seu carro, ano
1994, em ordem.
Segundo o regimento, bancar itens de limpeza em escritórios
particulares é prática proibida, assim como misturar despesas de uso público e
de uso privado. Aurélio Miguel (PR), porém, somou compras para seu gabinete com
compras supostamente escolares em notas fiscais de papelaria apresentadas em
fevereiro do ano passado. Há gastos com giz de cera, massinha e tinta guache. O
vereador afirmou ter feito o desconto dos itens, avaliados em R$ 26,40, no
pedido de reembolso.
Para a Câmara, o procedimento basta para corrigir o erro. No
caso de Hato, porém, o presidente da Casa, José Américo (PT), afirmou que
ordenará o desconto dos valores pagos indevidamente no próximo pedido de
reembolso do vereador, que não se manifestou.
Boletins. Na soma total, o maior volume de dinheiro é
destinado ao pagamento de serviços gráficos, como criação e impressão de
boletins que têm por objetivo formal mostrar aos eleitores o que o vereador faz
no mandato. No ano passado, essa conta foi de R$ 2 milhões, ou 22% do total.
Gastos com correio estão em segundo lugar, com R$ 1,5 milhão. Em seguida,
locação de carros oficiais, ao custo de R$ 1,3 milhão.
A análise das notas aponta também as diferenças de gastos
existentes entre um gabinete e outro da Câmara. Um grupo de parlamentares, por
exemplo, além dos ramais oficiais, tem linhas fixas de telefone.
Outro grupo afirma não ter computadores para todos os
funcionários trabalharem, o que os permite gastar com aluguéis de equipamentos
eletrônicos. Há quem pagou R$ 5 mil mensais no serviço. Consequentemente, o
dinheiro público também vai para a manutenção das máquinas. Somados, ambos os
serviços alcançaram mais de R$1,4 milhão em 2013.
Para o professor da FGV, as diferenças de preços indicam que
o modelo de descentralizar o uso da verba de gabinete, delegando a cada
parlamentar o poder de escolha do fornecedor, não é o mais econômico para a
Câmara. Valores como os gastos com serviços de informática permitiriam, por
exemplo, a realização de uma licitação para reduzir o desperdício e padronizar
as ferramentas de trabalho.
"Quando você descentraliza recursos e distribui para os
parlamentares gastarem da forma que querem, nada garante que está sendo pago o
menor preço, nada garante que o produto entregue é de qualidade. Uso de recurso
público requer economicidade, que é o melhor pelo menor preço, e legitimidade,
ou seja, que se gaste o que é necessário", disse Teixeira.
A Presidência da Casa informou que fiscaliza os gastos por
meio de amostragem, seguindo mensalmente parâmetros para averiguar se há
excessos.
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