quinta-feira, 23 de maio de 2019

O TRATOR DO GOVERNO ENGATOU A MARCHA À RÉ

Bernardo Mello Franco, O GLOBO
Desde que Jair Bolsonaro assumiu o volante, o trator do governo tem atropelado o Congresso, o Judiciário e quem mais ouse passar na frente. Ontem o piloto engatou a marcha à ré. No mesmo dia, recuou no decreto das armas e na convocação de passeatas a seu favor.
O presidente já havia acionado sua milícia digital para inflar os atos do próximo domingo. Chegou a indicar que iria a uma das manifestações. O objetivo era ostentar força e estimular o culto à própria personalidade.
Apesar do empurrão oficial, a tropa deu sinais de que não marcharia unida. Até o presidente do PSL, Luciano Bivar, achou melhor desertar. Disse não ver “sentido” na mobilização chapa-branca.
O porta-voz do Planalto, que havia celebrado os atos como um sinal de que “a sociedade está alinhada com o nosso presidente”, tentou suavizar o recuo. Disse que Bolsonaro desistiu de ir às ruas porque não quer “associar” as passeatas ao governo.
Se isso fosse verdade, o presidente e seus filhos não teriam se empenhado para divulgá-las. No mundo real, o Planalto farejou o risco de fiasco e apelou à receita de Neném Prancha: “Arrecua os arfes para evitar a catastre”.
No caso das armas, deu-se um fenômeno parecido. Bolsonaro estava orgulhoso do decreto, assinado numa cerimônia festiva com a bancada da bala. As críticas de estudiosos e os alertas de que o texto é inconstitucional não foram suficientes para constrangê-lo.
O presidente só pisou no freio depois da revelação de que o decreto autoriza a venda indiscriminada de fuzis. A notícia assustou até a facção menos radical do bolsonarismo, que endossa o discurso da legítima defesa para justificar o liberou-geral.
No Rio, a novidade ainda criaria uma contradição insanável. Bolsonaro estimula o “cidadão de bem” a comprar o próprio fuzil, e o governador bolsonarista manda a polícia atirar em quem porta a arma. A quem o sniper terá que obedecer?
Ontem o Planalto informou que o artigo que libera os fuzis pode ser revogado. O risco é o governo recuar neste ponto e manter o resto do decreto, que institucionaliza o bangue-bangue nas cidades brasileiras.
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