Um ex-executivo da OAS que se tornou delator na Operação
Lava Jato disse em depoimento que a empreiteira pagou propina a
Cesar Maia (DEM), ex-prefeito do Rio, por meio de contrato
fictício com o escritório de Sérgio Bermudes, um dos mais importantes
advogados do país.
O relato a procuradores da República compõe um conjunto
de mais de 200 temas em que oito
ex-funcionários que trabalhavam no departamento de propinas da
empreiteira delatam casos de corrupção envolvendo políticos e agentes públicos.
O acordo de colaboração premiada dos oito delatores foi
homologado pelo STF (Supremo Tribunal
Federal) em julho de 2018. Cesar Maia é pai do presidente da Câmara,
deputado Rodrigo Maia (DEM).
A história sobre esse suposto repasse ilegal feito ao
ex-prefeito Cesar Maia, hoje vereador no Rio, foi contada pelo ex-executivo
Marcelo Tadeu, um dos responsáveis pela geração de caixa dois usado para
pagamento de suborno.
Tadeu disse que, em 2013, recebeu uma ordem do então
presidente da OAS, Léo Pinheiro, e do superintendente da empreiteira no Rio,
Reginaldo Assunção, para que fizesse contato com o escritório de
Bermudes para viabilizar pagamentos cujo destinatário seria César
Maia.
Segundo Tadeu, iniciou-se então uma negociação com um
diretor da banca de advocacia. O acordo, segundo o delator, foi que a OAS
contrataria a firma de Bermudes e pagaria R$ 360 mil em honorários, mas nenhum
serviço advocatício foi prestado à empreiteira. O dinheiro, segundo o
executivo, era na verdade para quitar serviços prestados pelo escritório
diretamente a Cesar Maia.
O compromisso da OAS com Cesar Maia, segundo o delator, era
antigo. Começou quando a empreiteira se mostrou interessada na concessão da Linha
Amarela, via expressa que liga a Barra da Tijuca, na zona oeste, até a zona
norte carioca.
A obra começou no governo de Cesar Maia (1993-1996) e
terminou no de Luiz Paulo Conde (1997-2000), ex-secretário municipal que virou
seu sucessor. Em 1998, a OAS ganhou por 25 anos a concessão da exploração do
pedágio no trecho que vai do km 6, na Cidade de Deus, até o km 21.
A partir daí a empreiteira fez uma conta-corrente para
abastecer Cesar Maia, segundo o delator. Em 2013, segundo Tadeu, a maneira
encontrada pela empreiteira para repassar suborno ao ex-prefeito foi fazer um
contrato fictício com o escritório de Bermudes.
Tadeu juntou à delação trocas de emails em que executivos da
OAS negociam com um diretor do escritório de Bermudes os valores da propina, que
seriam pagas a título de honorários a Bermudes.
Sergio Bermudes é considerado um dos principais
advogados do Brasil nas últimas décadas. Na lista de clientes estão, por
exemplo, Eike
Batista e a empresa Vale, envolvida nas recentes tragédias de
Mariana e Brumadinho.
O quadro de advogados associados de Bermudes não é menos
importante.
O ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência Gustavo
Bebianno fez a carreira no seu escritório antes entrar no governo de
Jair Bolsonaro — ele caiu do cargo na gestão federal em
fevereiro.
O escritório de Bermudes em Brasília é chefiado por Guiomar
Mendes, esposa do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal.
Em documento obtido pela Folha, o ministro do
Supremo Edson Fachin, que homologou a delação do grupo de colaboradores da OAS,
autorizou o envio do conteúdo do depoimento que envolve Cesar Maia à Justiça
Federal do Rio de Janeiro, conforme pedido pela Procuradoria-Geral da
República.
O despacho é datado de 1º de agosto do ano passado. O
ministro impõe, porém, sigilo sobre os autos transferidos.
OUTRO LADO
O ex-prefeito Cesar Maia disse que não há
"nenhum sentido" no relato da delação da OAS que o
menciona. Afirma que não tem nenhuma informação sobre o contrato citado entre a
construtora e o escritório e que isso não o envolve.
Em nota enviada à reportagem, Sérgio Bermudes nega que o
escritório tenha firmado um contrato fictício com a OAS. Ele disse que a
firma assumiu em 2013 a defesa em um inquérito aberto sobre supostas irregularidades
em um hospital municipal atribuídas tanto a Cesar Maia quanto à OAS.
"Ciente de que o ex-prefeito havia pedido a nossa
assistência também no inquérito, a OAS nos contratou para acompanhamento desse
procedimento. Como se sabe, o inquérito pode ser preparatório de uma ação civil
pública que, meses depois, foi proposta."
Ele afirma que a ação acabou condenando em primeira
instância os réus à devolução de dinheiro e proibiu a OAS de contratar com o
poder público.
Bermudes também disse que Maia deixou a prefeitura em 2008 e
que as datas "afastam qualquer possibilidade de pagamento ao ex-prefeito
por favores alegadamente feitos por ele". O valor de R$ 360 mil, disse,
foi pago em parcelas mensais de R$ 30 mil.
Procurada, a OAS afirmou apenas que não tem qualquer
relação com depoimentos de ex-executivos da companhia. Disse ainda que tem
contribuído com autoridades competentes para esclarecimentos que se façam
necessários.
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