segunda-feira, 18 de novembro de 2019

OPÇÃO INSEGURA

Editorial Folha de S.Paulo
É temerário o modo escolhido para pôr em prática a decisão do presidente Jair Bolsonaro de extinguir o DPVAT, o seguro obrigatório de veículos existente desde 1974.
O governo tem razão em apontar ineficiências no sistema, como o baixo valor das indenizações, o excesso de intermediários e de burocracia, além das fraudes. Faz sentido mudar esse estado de coisas.
Não se conseguiu demonstrar, porém, que a eliminação pura e simples do mecanismo, por medida provisória, constitui a melhor solução. Uma das consequências é que o Sistema Único de Saúde, que incorre em despesas ao prestar atendimento médico a vítimas de acidentes de trânsito, perderia uma fonte de financiamento.
Hoje, 45% da arrecadação do DPVAT vai diretamente para o SUS. Em 2018, foram R$ 2,1 bilhões, entre os R$ 4,7 bilhões processados pelo seguro. Especialmente num momento de forte restrição orçamentária, não se trata de um dinheiro do qual se possa abrir mão.
Haveria a alternativa, por exemplo, de substituir o instrumento por um tributo a ser pago pelos donos de veículos, destinando os recursos à saúde. Ou a de acabar com o sistema de consórcio e apenas exigir dos proprietários que contratem um seguro básico.
Neste caso, as seguradoras precisariam concorrer umas com as outras pelos clientes, o que muito provavelmente levaria a ganhos de eficiência. Um bônus possível é que motoristas incorrigíveis, que não conseguissem cobertura por nenhuma seguradora, em tese não poderiam mais assumir o volante.
Também relevante se mostra a questão das indenizações. Ainda que haja burocracia desnecessária no DPVAT, a liberação de um seguro é bem mais rápida do que uma ação judicial, o que faz toda a diferença para a vítima de acidente.
Ademais, o seguro paga sem considerar qual parte é culpada, o que cumpre uma função social. Mesmo o pedestre que atravessou no sinal vermelho deve contar com apoio em caso de atropelamento, para si ou para sua família.
Outro erro do governo está em promover a mudança —que, coincidência ou não, prejudica seu desafeto Luciano Bivar, presidente do PSL e dono de seguradora— por medida provisória.
Se a MP não for chancelada pelo Congresso em 120 dias, o que tem acontecido com alguma frequência, perderá a validade, contribuindo para a insegurança jurídica que tanto mal faz ao país.
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