Na noite de 20 de setembro, um tiro de fuzil atingiu as
costas de Ágatha Félix, de 8 anos. A menina estava com a mãe no banco traseiro
de uma Kombi, no Complexo do Alemão. Foi submetida a uma cirurgia de cinco
horas, mas morreu no hospital.
Os parentes da vítima disseram que o tiro partiu de um
policial militar. O motorista da Kombi confirmou o relato. “Não teve tiroteio,
foi só o policial que disparou”, contou. O porta-voz da PM, Mauro Fliess,
contestou as testemunhas e disse que os agentes reagiram a um ataque de
“marginais”. O coronel aproveitou para fazer propaganda. “Não iremos recuar. O
governo está no caminho certo”, discursou.
A versão de tiroteio foi mantida por 60 dias e sustentada em
ao menos duas notas oficiais. Era falsa, informou ontem a Polícia Civil.
Responsável pela investigação, o delegado Marcus Drucker concluiu que não houve
confronto no local. O PM tentou balear um motociclista, errou o alvo e acertou
a menina que sonhava em virar bailarina.
“A primeira reação do governo foi dizer que todas as
testemunhas estavam mentindo, inclusive a mãe da Ágatha”, critica o advogado
Rodrigo Mondego, da Comissão de Direitos Humanos da OAB. Quem mentiu no caso
foi a PM, na tentativa de desacreditar a família e proteger o culpado pelo
crime.
Nos primeiros nove meses do ano, a polícia matou 1.402
pessoas no Estado do Rio —uma média superior a cinco mortes por dia. Apesar da
estatística macabra, o governador Wilson Witzel insiste na apologia do “tiro na
cabecinha”. Sua política de segurança estimula o bangue-bangue, aterroriza as
favelas e aumenta o risco de vítimas inocentes.
Ágatha foi uma das seis crianças mortas por bala perdida no
Rio em 2019. Todas eram negras, pobres e viviam em bairros periféricos. “Os
negros são as principais vítimas da ação letal das polícias e o perfil
predominante da população prisional do Brasil”, lembrava uma placa exposta até
ontem no Congresso. A peça foi arrancada e pisoteada pelo deputado Coronel
Tadeu (PSL-SP), um dos próceres da bancada da bala.
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