A obstrução da reforma administrativa pelo Palácio do
Planalto nada tem a ver com a necessidade de garantir mais foco aos projetos de
reformas fiscais e ao pacote de estímulo ao emprego, que já estão no Congresso.
Desde o início, a estratégia governista foi a de enviar as
principais agendas de reformas no primeiro ano de governo e acomodar as
prioridades de votação na articulação com as lideranças políticas. Passada a
Previdência, esse era o roteiro. Todas as reformas num embalo só.
O fato é que a equipe econômica costurou um projeto
ambicioso de mudanças no RH do serviço público, mas não acertou direitinho os
detalhes com o presidente e seus principais auxiliares. Jair Bolsonaro já
declarou que quer uma proposta de reforma mais “suave”.
O presidente está cansado das pautas impopulares.
O presidente está cansado das pautas impopulares.
Os sinais de irritação do Palácio foram sentidos quando a
equipe econômica deixou para a última hora a decisão de enviar, à Casa Civil, o
texto final das Propostas de Emenda à Constituição (PEC) do pacto federativo,
do ajuste emergencial e de alteração dos fundos setoriais.
Na véspera do anúncio das três PECs, o clima esquentou, com
bate-boca entre as equipes. Itens foram retirados do texto, entre eles uma
medida que permitia que as despesas dos Estados e municípios com salários de
inativos pudessem ser utilizadas para cumprir os mínimos constitucionais de
gastos com saúde e educação.
Gato escaldado, o Palácio do Planalto adiou o lançamento da
reforma administrativa, uma peça importante do ajuste fiscal de três pontas
pensado pela equipe de Guedes: manutenção do teto de gastos, reforma da
Previdência e controle das despesas de pessoal – um gasto que ameaça mais as
contas dos Estados do que as da União.
Deu que no deu: vários adiamentos do seu lançamento e
aumento da pressão para que o envio do texto ficasse para 2020. Isso se
ocorrer. Já há quem duvide que a reforma saia no ano que vem. Na melhor das
hipóteses, sairá do Palácio bem menor do que entrou.
Depois de tentar reverter, ao longo da semana, a posição do
presidente de segurar a reforma, Guedes acabou admitindo, nesta sexta-feira,
que ela ficará para depois.
Um erro de estratégia já apontado por seus auxiliares foi o
desejo do Ministério da Economia de fazer uma mudança geral para todo o serviço
público e carreiras da União, Estados e municípios. Isso afeta diretamente
apoiadores do presidente oriundos da área de segurança, com muita força no
Palácio do Planalto.
Embora negue oficialmente, o ministro da Justiça, Sergio
Moro, também interferiu ao manifestar preocupações com a reforma. O
procurador-geral da República, Augusto Aras, foi outro que reclamou.
Integrantes dos demais Poderes e representantes dos
sindicatos mais influentes do funcionalismo foram chamados, em seguida, para
diálogo. O argumento dado pelo governo aos líderes sindicais, de que proposta
só atingirá os novos servidores que entrarem no serviço publico, não colou.
O texto será avaliado com lupa pela equipe palaciana, mais
interessada em não prejudicar as carreiras que lhe dão apoio político.
Minirreforma
Minirreforma
A rejeição à reforma administrativa agora esbarra também na
proposta da equipe econômica de incluir nas PECs fiscais uma “cota de
sacrifício” aos servidores. Uma delas prevê, entre outros pontos, a possibilidade
de reduzir, por dois anos, a jornada e os salários de servidores em até 25%,
reajustes, concursos e também congelar novas promoções – o que, na prática,
alongaria o tempo necessário para chegar ao topo da carreira. Essas medidas
poderão ser adotadas se for decretado estado de emergência fiscal para correção
dos desequilíbrios fiscais.
A possibilidade de corte da jornada de trabalho caiu com uma
bomba no funcionalismo de todo o País. Ninguém quer perder de uma hora para
outra 25% da sua renda. Na prática, essas propostas de ajuste já estão sendo
consideradas uma minirreforma administrativa antecipada.
Os debates mais fortes sobre as medidas fiscais vão se
concentrar nesse ponto no ano que vem. Nada vai passar neste ano, nem mesmo no
Senado, que prometeu agilidade na tramitação para ter mais protagonismo que a
Câmara na agenda econômica. Embora o fim dos privilégios da elite do
funcionalismo, principalmente no Judiciário, tenha apoio da população, essa
mesma narrativa usada na reforma da Previdência ficou desgastada com as
exceções abertas para algumas categorias.
O próprio governo fez uma reserva de mercado nas PECs
fiscais. Juízes, procuradores do Ministério Público, militares e diplomatas
continuarão sendo promovidos, mesmo se for decretado o estado de emergência
pelo Estado ou município em que trabalha ou pela União, no caso dos servidores
federais. Esse ponto passou despercebido com tantas medidas, mas vai voltar ao
debate. E, claro, dificultar o discurso de “fim dos privilégios” para todos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário