Há algo de tenebroso em um governo no qual viceja o ambiente
para que um estafeta neonazista do bolsonarismo, o agora demitido do comando da
pasta da Cultura Roberto Alvim, se sinta à vontade para proferir um discurso tão
abjeto como ao que o País assistiu dias atrás, enaltecendo e copiando o gênio
do mal da propaganda hitlerista, Joseph Goebbels. A permissividade e o flerte
oficial com o totalitarismo estão em voga e alavancaram a escalada perigosa de
abusos que se verifica hoje nessas paragens tropicais do Brasil, em franca
convulsão de extremos.
É da mesma lavra, e possui os mesmos ingredientes teatrais,
tanto as falas como os atos do ministro da Educação, dançarino na chuva e
ignorante no vernáculo (demonstrado em inúmeras ocasiões), Abraham Weintraub.
Por decisão dele, paira no ar, dentre outras aberrações, a ameaça de extermínio
de quase três milhões de livros didáticos, sob a alegação de que carregariam
conteúdo altamente dirigido. Weintraub, no seu show de peripécias inomináveis,
acaba de protagonizar o maior desastre de exames do Enem em toda a década, com
erros no gabarito e notas mal avaliadas contadas às milhares. Isso tudo depois
de se vangloriar de ter coordenado um concurso perfeito.
Apenas na cabeça dele! Os retrocessos na Educação e na
Cultura são a face mais macabra da ascensão de uma doutrina ideológica
alienante e cerceadora de liberdades que plantou raízes por aqui desde a
chegada do “Mito” ao poder. Paulo Guedes, o czar da economia, e o filho 03,
Eduardo Bolsonaro, já aventaram o resgate de medidas de exceção tais quais as
do AI-5, que no interregno da ditadura militar cassaram direitos, promoveram
prisões arbitrárias, torturaram e mataram adversários do regime. O embaixador
Ernesto Araújo, com a chancela do próprio capitão-presidente, tachou o nazismo
como um fenômeno de esquerda.
E o secretário-geral da comunicação oficial, titular da
Secom, Fábio Wajngarten, acaba de avisar que todas as pontes com a imprensa
foram implodidas. Logo ele, o homem da comunicação, diz que o governo não quer
mais se comunicar. Promove abertamente uma tentativa de asfixia financeira dos
críticos, dirigindo verbas aos seus clientes privados (em claro conflito de
interesses), enquanto censura a publicidade estatal naqueles veículos tidos por
ele como “não convertidos”.
E Bolsonaro concorda, concede e passa a mão na cabeça do
subordinado que faz esquemas. Nas “lives” improvisadas de Messias, lançadas
semanalmente nas redes digitais para a legião de seguidores, a pregação de
mensagens subliminares fica ainda mais evidente. Na última delas ele falou em
reescrever a trajetória do Brasil de 1500 até agora, contando “a história
verdadeira”.
Leia-se: a sua verdade histórica. O dirigismo ideológico que
induz à maquiagem de fatos e à tirania de valores sociais, repudiando a
diversidade e impondo o preconceito, é típico dos governos autocratas. São
alarmantes os sinais nesse sentido. Jair Bolsonaro deseja se apropriar
politicamente do que entende ser uma luta santa contra o mal. Prega, a exemplo
do ex-secretário Alvim — a quem demitiu apenas devido às pressões -, que o povo
precisa ser salvo de uma cultura doente e que só são passíveis de financiamento
público projetos artísticos que se prestem a difundir a ideia de nação
concebida segundo seus valores.
Por esse modelo será “nacional”, como defendia Alvim (a quem
o presidente elogiou publicamente momentos antes da queda), apenas aquilo que
obedecer aos critérios estabelecidos pelo Estado. Alvim se foi, mas a pregação
odiosa deixada por ele mantém-se à tona. Em muito ela lembra os ideais do
“Führer”, de submissão coletiva a um fundamentalismo programático. O
mandatário, que tece loas a ditadores sanguinários como Pinochet e Stroessner e
classifica de herói o torturador Brilhante Ustra, parece à vontade para
construir uma gestão marcada por essa mesma estética degenerada de controle
social. Não se intimida com as críticas.
Não encontra sequer tantas resistências assim. Talvez porque
a maioria entenda como meras estultices as suas declarações. Não são. Sistemas
fascistas normalmente vêm precedidos da incredulidade geral e acabam por
arrebanhar àqueles frustrados por promessas não cumpridas e por problemas
cotidianos.
O cineasta Ingmar Bergman, em seu clássico “O Ovo da
Serpente”, já relatava com precisão o cenário de violência urbana, desemprego e
desencanto – como ocorre atualmente por aqui – que propiciou o surgimento do
nazismo na Alemanha hitlerista. Os falsos heróis e salvadores da pátria estão
sempre à espreita e, invariavelmente, acabam por tentar implantar regimes que
descambam para a crueldade, o racismo e a perseguição de direitos, em nome de
uma faxina moral totalitária.
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