A crise do coronavírus acabou dando uma chacoalhada no
governo, com mudanças de posições, ministros em alta, ministros em baixa e um
consenso constrangido entre todos eles: é preciso agir e atacar a doença em
conjunto, isolando o presidente Jair Bolsonaro. Não por ser do grupo de risco,
ter mais de 60 anos e estar cercado de contaminados por todos os lados, mas
porque é urgente que ele pare de atrapalhar.
Em alta no próprio governo e na opinião pública está o
ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, sistematicamente desautorizado pelo
presidente, mas reconhecido pelos colegas ministros, que temem a força do
coronavírus e a demissão do personagem-chave do combate à epidemia. Demitir
Mandetta seria esfacelar, no momento decisivo, toda a estrutura do Ministério
da Saúde, que tem o controle da operação e o reconhecimento popular.
Além de Mandetta, dois generais estão em alta: Braga Netto,
da Casa Civil e com sala próxima do gabinete presidencial, e Fernando Azevedo e
Silva, da Defesa, que despacha em outro prédio, mas é personagem assíduo no
Planalto. Os dois têm duas características comuns: relacionam-se há anos com
Bolsonaro e são respeitados pela cúpula do poder, que recorre a eles quando é
preciso “dar um jeito no capitão”. Carioca jeitoso, Fernando foi colega de
turma do insubordinado Bolsonaro no Exército.
Na balança, Braga Netto e Fernando Azevedo sobem, dois
outros generais descem: Augusto Heleno, do GSI, sobre quem repousavam as
melhores expectativas no início do governo, e Luiz Eduardo Ramos, secretário de
Governo, que chegou ao governo para cobrir o vácuo de Onyx Lorenzoni, o chefe
da Casa Civil que acabou trocado por Braga Netto. Heleno, que pegou
coronavírus, parece estar se cansando do jogo. Ramos sofre pelas virtudes, não
pelos defeitos: a personalidade contemporizadora, oposta à dos Bolsonaro.
Também em baixa o verdadeiro mito do governo, Sérgio Moro,
alvo do mesmo ciúme que o presidente dedica agora a Mandetta e já despejou
sobre Gustavo Bebianno, general Santos Cruz e até sobre Regina Duarte, logo na
largada. Moro foi desautorizado inúmeras vezes, a última delas quando assinou o
decreto suspendendo a entrada de estrangeiros de vários países. Bravo,
Bolsonaro riscou sem pestanejar os cidadãos dos EUA – hoje, campeão de casos
confirmados.
Depois das sucessivas desautorizações, Moro se recolheu e
Bolsonaro passou a cobrar o contrário. Antes, condenava os “excessos” do
ministro, que aparecia demais na mídia e lhe ofuscava a popularidade. Hoje,
critica a “omissão” dele, reclamando que a área jurídica do governo está
“acéfala”, o governo perde uma atrás da outra no Supremo e em todas as
instâncias.
Na segunda-feira, 30, aliás, o ministro Dias Toffoli disse
que não se combate o vírus com “achismos” e outros ministros do STF avisaram
que vão derrubar medidas contrárias à saúde e à ciência. E, se Bolsonaro havia
conclamado os políticos a saírem às ruas, como ele próprio fez no domingo,
todos os líderes do Senado responderam com um sonoro “não”, em forma de
manifesto a favor do isolamento social.
Assim, Bolsonaro está isolado dentro e fora do Brasil.
Seguindo os líderes que prudentemente decretaram o isolamento social contra o
coronavírus desde o início, também os teimosos Trump (EUA), Boris Johnson
(Inglaterra) e Giuseppe Conte (Itália) se renderam às evidências. Ou seria à
realidade?
Há poucos dias, Bolsonaro disse, todo orgulhoso, que Trump
seguia “uma linha semelhante à nossa”. Mas, com quase 140 mil infectados e
2.500 mortes nas suas barbas (ou cabeleira), até Trump acaba de recuar e
estender o isolamento para 30 de abril. O presidente brasileiro vai esperar
tanto para cair na real?
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