Todo mundo notou.
Os gestos nervosos nas entrevistas coletivas, o tom de voz
acima do normal nas saídas do Alvorada e os olhos injetados no pronunciamento
do dia 31 denunciam o que assessores palacianos confirmam: os nervos do
presidente Jair Bolsonaro estão por um fio e ele se sente pressionado por todos
os lados. Bolsonaro deu até mesmo para chorar no meio do expediente, como
revelou o repórter da Folha de S. Paulo Igor Gielow. Sua agenda oficial
tornou-se uma planície desolada. Hoje, quarta-feira, registrava um único
compromisso: audiência com o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo,
das 10h às 10h30, e mais nada.
Para Bolsonaro, o mundo está contra ele. Não bastasse o que
considera oportunismo político de seus adversários (os governadores João Dória
e Wilson Witzel, em especial), seus principais ministros - Sérgio Moro, Paulo
Guedes e Henrique Mandetta, homens que ELE próprio escolheu, como lembra sempre
que pode— alinharam-se contra ele na defesa do isolamento social. "O
presidente sou eu, pô. O presidente sou eu", achou por bem lembrar a um
repórter que lhe perguntou sobre o fato de o vice, Hamilton Mourão, também ter
defendido a quarentena como forma de evitar a disseminação do coronavirus.
Isolado em sua teimosia e sentindo-se ameaçado em sua
autoridade, Bolsonaro oscila entre socorrer-se junto aos generais palacianos
-que, no ano passado, havia deixado em banho-maria por não querer ser por eles
"tutelado"—ou ouvir os conselhos do filho Carlos, comandante em chefe
dos atiçadores oficiais das massas, assessores do presidente que atuam nas
redes sociais com tal beligerância que fizeram por merecer a alcunha de
integrantes do "gabinete do ódio".
Ocorre que, a cada vez que o presidente segue os conselhos
dos generais, desagrada a turma de Carlos - e o contrário é também verdadeiro.
O pronunciamento inusitadamente sensato do dia 31 de março teve a influência de
Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército a quem Bolsonaro havia visitado
no dia anterior, e o dedo do general Braga Netto, chefe da Casa Civil e estrela
ascendente no Palácio. Se soou como música para os ouvidos dos moderados,
irritou na mesma intensidade os bolsonaristas raiz, seguidores de Carlos
Bolsonaro e companhia.
Uma hora e meia depois do pronunciamento do presidente, a
agência de análise digital Bites registrou o menor número de pessoas tuitando
em favor dele nos últimos quinze dias. Já quando o ex-capitão fez o discurso em
que chamou a Covid-19 de "gripezinha" e afirmou que "atleta não
pega isso", sua claque virtual foi ao êxtase.
Ou seja, quando Bolsonaro age de forma comedida e sensata,
deixa a militância apática. Quando radicaliza e diz atrocidades, ganha mil
pontos com ela.
Ontem, militares do núcleo duro do Palácio do Planalto
avaliavam que as duas próximas semanas serão cruciais para determinar os rumos
da crise. A pandemia do coronavírus deve atingir o pico no período.
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