É muito mais deletério do que conseguimos mostrar em texto
de análise política o efeito que pregações irresponsáveis como as do presidente
Jair Bolsonaro contra as estratégias de distanciamento
social provocam no efetivo combate à pandemia
do novo coronavírus.
Essa influência perniciosa não só atiça a natural e
justificável ansiedade das pessoas por retomar suas vidas “normais”, como se
fosse possível prever qual será o novo normal a partir de agora. Ela também, é
possível perceber agora, acabou por criar nos governadores e prefeitos, mesmo
naqueles conscientes dos riscos reais da pandemia, uma pressão para dizerem
quando e de que forma reabririam comércio, escolas e outros estabelecimentos, o
que se deu, desde a semana passada, de forma claramente irrefletida, precipitada
e inócua.
Os casos de contaminação e as mortes continuam em ritmo
acelerado, sem que nenhuma das condições necessárias para que se comece a falar
em saída das quarentenas esteja dada. Não começamos a testar de forma
mais sistemática e massiva, para ter números mais fiéis a refletir em que
momento da epidemia estamos, a ocupação dos leitos de hospitais e de UTIs não
está em curva decrescente na maior parte do País, os casos (mesmo esses que
conseguimos confirmar, uma fração ínfima do total) não estão estabilizados e,
mais assustador de tudo, mesmo os países que fizeram tudo certo e começaram a
abrir estão experimentando más notícias.
Se a ocupação dos leitos e a progressão do contágio
continuarem no ritmo dessas duas semanas, ao contrário, é muito provável que
o governador
João Doria Jr. e o prefeito
da capital, Bruno Covas, tenham de anunciar restrições ainda mais
severas, e não relaxamento do distanciamento social. Foi assim em Milão, Nova York e outras cidades com as
características de São Paulo.
Mesmo lugares de populações e circulação mais restritas e
controláveis, como Brasília, talvez tenham relaxado as regras cedo demais.
Afinal, basta que a capital do País volte a receber fluxos de viajantes, a
começar dos políticos, de outros Estados para que uma nova onda de contaminação
seja não apenas possível, como provável.
Basta ver que países que chegaram a ser citados como
exemplos de combate à covid, como Cingapura (que
testou massivamente) e Alemanha (que
tinha proporção confortável de leitos de UTI por milhões de habitantes e fez um
isolamento social rigoroso), tiveram ou terão de anunciar a volta de medidas
restritivas porque os casos voltaram a subir.
Diante de um quadro tão grave e imprevisível, é ainda mais
bizarro que o presidente do Brasil esteja dedicado única e exclusivamente a
aparelhar ministérios e cargos públicos, demitir ou desautorizar os poucos
ministros que passariam num psicotécnico e em confronto aberto com as
instituições.
Desde que trocou Luiz Mandetta pelo desarvorado e desanimado
Nelson Teich, Bolsonaro parece ter esquecido que há um vírus matando
seus governados aos milhares. Não fala mais sobre coronavírus (o que pode até
ser bom, dado o nível de patacoada que ele costuma dizer a respeito) nem cobra
ações efetivas para achatar uma curva que ameaça colapsar o País tanto no plano
médico-sanitário quanto no tão temido aspecto econômico.
Não vai dar para reabrir o Brasil na marra, como a essa
altura até Teich já deve ter conseguido se dar conta. Que
os governadores parem de ficar com medo do bafo quente das ruas e ajam com
responsabilidade. De irresponsável já basta um.
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