O vídeo liberado pelo ministro Celso de Mello expõe as
vísceras da extrema direita no poder. A gravação mostra como Jair Bolsonaro
transportou a lógica da milícia para o governo. A função da Polícia Federal é
proteger a família e os amigos do presidente. A tarefa dos ministros é defender
o chefe do alcance da lei. “O que os caras querem é a nossa hemorroida!”, brada
o capitão, antes de atacar prefeitos e governadores aos palavrões.
Bolsonaro comanda a reunião no Planalto como se estivesse
num churrasco em Rio das Pedras. Entre berros e xingamentos, ele diz estar “se
lixando” para a reeleição. Em seguida, avisa que a vitória de um adversário em
2022 pode levá-lo para a cadeia. “Se for a esquerda, eu e uma porrada de vocês
aqui tem (sic) que sair do Brasil, porque vão ser presos”, ameaça. Todos os
ministros estavam presentes, e nenhum deles se encorajou a retrucar.
A gravação reforça as suspeitas de interferência indevida na
PF. “Eu não vou esperar foder a minha família toda de sacanagem, ou amigos
meus”, diz o presidente. “Vou interferir e ponto final”, acrescenta. Dois dias
depois, ele cumpriu a promessa. Demitiu o diretor-geral da polícia, à revelia
do ministro da Justiça.
O vídeo fornece matéria-prima para novas frentes de
investigação. Num trecho, o capitão revela a existência de um sistema
particular de informações. Na noite de sexta, ele disse que essa rede
clandestina o avisou da “possibilidade de busca e apreensão na casa de filho
meu”. “Levantei isso. Graças a Deus, tenho amigos policiais civis e policiais
militares do Rio”, contou.
Em outra passagem da fita, o presidente fala em “escancarar
a questão do armamento” e ordena a publicação de uma portaria para facilitar a
venda de armas a civis. “Eu quero dar um puta de um recado pra esses bostas”,
diz, referindo-se a prefeitos que decretaram medidas de isolamento contra o
coronavírus. O presidente estimula a formação de grupos paramilitares, o que é
proibido pela Constituição. Cinco generais e um almirante ouvem o disparate sem
abrir a boca.
O clima de conspiração contra a República domina as
conversas na sala. Abraham Weintraub defende a prisão de ministros do Supremo
Tribunal Federal. “Por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia”, vocifera.
Damares Alves sugere prender prefeitos e governadores. O presidente fala em
“pedir às Forças Armadas que intervenham pra restabelecer a ordem no Brasil”.
Ele cita três vezes o artigo 142 da Constituição, fetiche da militância
bolsonarista que clama por uma “intervenção militar”.
Enquanto o capitão e seus aloprados sonham com um golpe,
outros ministros falam em aproveitar a pandemia para afrouxar leis e liquidar
patrimônio público. Ricardo Salles sugere “passar a boiada”, desmontando o que
resta da legislação ambiental. Paulo Guedes defende uma privatização a jato do
Banco do Brasil. “Tem que vender essa porra logo!”, afirma.
Num momento em que milhares de negócios quebram sem apoio do governo, o vídeo expõe as prioridades do economista-chefe do bolsonarismo: “Nós vamos ganhar dinheiro usando recursos públicos pra salvar grandes companhias. Agora, nós vamos perder dinheiro salvando empresas pequenininhas”.
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