A entrevista do empresário Paulo Marinho a Mônica Bergamo
abriu um verdadeiro carretel de linhas soltas no passado do clã Bolsonaro. Uma
delas era a inexplicável demissão no mesmo dia de 15 de outubro de Fabrício
Queiroz e de sua filha Nathahia, ambos da copa e cozinha da família, entre o
primeiro e o segundo turno das eleições presidenciais em 2018. Evidente que
havia boi na linha.
Marinho deu uma pista para uma investigação que, se for a
fundo, além do estrago político em Brasília, pode expor o conluio entre as
diversas polícias e governantes com bandidos de todos os naipes que levaram o
Rio de Janeiro ao caos. O incômodo dos Bolsonaros e dos políticos alvos de
investigações no Rio é que, cada vez mais, novas gestões na Polícia Federal
passaram a dificultar a por a sujeira embaixo do tapete.
Foi assim que a PF melhorou ali seu desempenho e, como todas
as forças de investigação sobre corrupção, também teve um upgrade com a
operação Lava Jato. O delegado Ricardo Saad, um profissional que se destacou em
São Paulo pelo rigor e preparo técnico, parecia ser o chefe perfeito na PF do
Rio de Janeiro para um governo que tinha o combate à corrupção e ao crime
organizado como carro-chefe.
Sua correção profissional virou defeito no submundo político
do Rio e no gabinete presidencial no Palácio do Planalto. A tal ponto de Jair
Bolsonaro, no ano passado, começar a exigir sua cabeça com ameaças de demissão
ao então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, e de Sérgio Moro, o então principal
trunfo popular do governo. Houve a troca. Moro e Valeixo só não aceitaram uma
mudança com cartas marcadas. Bolsonaro ganhou, mas não levou.
Não conseguiu emplacar o sucessor, a vaga foi ocupada pelos
critérios da Polícia Federal. E não pelo aval do seu clã. A troca não foi
engolida. Na ótica do seu mundinho familiar, com as polícias estaduais sob
comando do governo Wilson Witzel, não adianta comandar Marinha, Exército e
Aeronáutica no jogo pesado do submundo político no Rio de Janeiro. Eles avaliam
que precisam de algum aparelho policial.
Mesmo quando eram nanicos na política, sobreviviam nas
franjas do poder, tinham ligações com gente da polícia e alguns chefes
milicianos, o que lhes parecia suficiente. Mas ao alcançarem o centro do poder
nacional, com todos os serviços de inteligência federais à disposição,
continuaram inseguros no Rio de Janeiro. Até canais de informação tradicionais
foram obstruídos com Fabrício Queiroz na clandestinidade e a morte do capitão
Adriano Magalhães da Nóbrega, acusado de ser chefe de milícia e do temido
Escritório do Crime.
Pela acusação de Paulo Marinho, um delegado da PF saiu da
sede de sua superintendência na Praça Mauá para vazar as informações do que
seria a futura operação Furna da Onça que expôs a tal Rachadinha, uma
roubalheira generalizada na Assembleia Legislativa. Mais do que vazar, o citado
delegado valorizou seu passe ao assegurar que nada seria divulgado antes do
segundo turno entre Bolsonaro e Fernando Haddad na eleição presidencial.
Promessa cumprida.
O Ministério Público e a Polícia Federal dizem que vão
investigar. Deve fazer parte da investigação comandada no STF pelo decano Celso
de Mello que vai acumulando indícios e provas sobre as denúncias de Sérgio Moro
contra Jair Bolsonaro. Vai se complicando o script sonhado no Palácio do
Planalto de que o procurador-geral da República, Augusto Aras, rapidamente
pediria para que as apurações fossem arquivadas. Lá, ainda não entenderam que
uma investigação, depois de aberta, sejam quais forem as intenções de seus
autores, podem ganhar pernas próprias.
Além disso, as acusações de Paulo Marinho tem de ser
esclarecidas por outros motivos. Nas redes sociais, o delegado Alexandre
Ramagem, pivô da crise que resultou na demissão de Sérgio Moro, é apontado como
o vazador para a família Bolsonaro. Quem apurou a história, como a repórter
Thais Oyama, diz que é outro o delegado fonte de Flávio Bolsonaro. A depender
dos esclarecimentos, pode servir para o delegado Ramagem se livrar do estigma
de pau mandado dos Bolsonaros.
Mas também uma boa oportunidade para chacoalhar a PF no Rio
a esclarecer, tim por tim, a obsessão do clã Bolsonaro pelo comando da Polícia
Federal no Rio de Janeiro.
O que no Rio pode ser apenas um trunfo pela sobrevivência
numa guerra em submundos pouco conhecidos, em Brasília é causa de
pandemônio geral. Os medos e paranoias dos Bolsonaros desestabilizam o governo
tanto quanto a pandemia do novo coronavírus. Além do custo do desgoverno, podem
até custar o mandato do presidente da República pela insistente tentativa de
interferir em instituições do Estado em benefício dos interesses do seu clã.
A conferir.
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