domingo, 24 de maio de 2020

DIÁRIO DA CRISE LXIV

Do Blog do Gabeira

Mais um domingo de quarentena. Não estou nem contando domingos. Usei parte do dia para escrever um texto para um livro coletivo sobre o coronavírus.

Querem que você preveja o futuro.

Mas o futuro é meio opaco, precisamente por causa do vírus.

De qualquer forma, pude refletir sobre a atualização da consciência ecológica diante da pandemia.

Falei um pouco da importância do desmatamento na insegurança biológica. Sou testemunha disso, pois cobri a volta da febre amarela no norte de Minas e outros pontos do país. A derrubada das matas teve um papel. A gente pode constatar isso. Naquele tempo não tinha nada de quarentena, nem grupo de risco. Vacinados, era possivel observarmos tudo.

Escrevi também sobre a relação com os animais. Os mercados chineses são um problema com tantos animais silvestres empilhadas sem condição de higiene.

Mas os grandes matadouros industriais no mundo ocidental também terão de ser revolucionados. Muitos trabalhadores contraíram o vírus. O ambiente pela falta de espaço para os animais, pela própria facilidade de surgimento de doenças, está sendo reavaliado.

Choveu, foi um domingo meio feio.

Mexi com fotos do meu arquivo. Lembrei-me de outros domingos, alguns chuvosos também.

As vezes passei domingos em pequenas cidades do nordeste. Gosto muito de fotografá-las num dia assim. O centro é vazio. Concentro-me nas portas de aço das lojas. E fico esperando acontecer alguma coisa diante delas.

Lembrei-me também de alguns domingos com as meninas, no mar de Angra. Eles gostavam de pular do barco, o mais alto possível.

Revi umas fotos do nosso grupo de risco, os velhos da piscina. Vou postá-las um dia. Armando no esplendor dos seus 93 anos, com uma toalha azul em torno do pesçoco, Silvio aos 90.

Não avancei muito mais na lembrança pois são muitos domingos. Inclusive os de grande prêmio Brasil no Jockey, eram tardes bonitas. Alguns domingos cinzentos em Santiago, gelados em Estocolmo. São muitos domingos, não há tempo nem para uma minúscula fração deles.

Amanhã acaba essa nostalgia, mesmo se continuar a chuva. É preciso planejar o trabalho matinal, o podcast de terças, lives e mais lives, inclusive uma delas muito importante para mim, com pessoas que atuam no Congresso.

São poucos, raros, mas o momento é muito delicado. Fiquei impressionado com a nota do general Heleno, manifestações de militares da reserva. Eles insinuam a possibilidade de um golpe.

Na verdade, falam em guerra civil. O discurso de Bolsonaro sobre a necessidade de armar a populacão, não apenas para se defender de assaltos, mas para exprimir suas posições políticas, é um indício assustador.

Precisamos evitar um golpe , evitar o clima de guerra civil. Somos o epicentro da pandemia de coronavírus, já perdemos mais de 20 mil pessoas, e os generais estão focados em guerra civil.

Tudo o que precisamos é superar o auge da doença, voltar progressivamente ao trabalho e enfrentar a grande crise econômica que nos espera.

É mais do que necessário uma grande frente democrática que enfrente os problemas reais e dissipe ou pelo menos isole esses ressentimentos extremistas.

No artigo que publico amanhã no Globo digo claramente que não vamos cometer o erro de resistir com armas, como no passado. O negacionismo da pandemia e a destruição consciente da Amazônia tornam o governo de Bolsonaro não apenas perigoso para nós mas para toda a humanidade. Essa é alavanca para levantar o mundo a nosso favor.

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