Diante do avanço das investigações sobre suas tentativas de
intromissão nos assuntos da Polícia Federal, o presidente Jair Bolsonaro se
mostra a cada dia mais empenhado em tumultuar o processo.
No domingo (24), dois dias após a divulgação do vídeo da
reunião ministerial em que manifestou o desejo de intervir na PF, o mandatário
foi a uma rede social provocar
o ministro Celso de Mello, que conduz o inquérito no Supremo Tribunal
Federal e liberou o material.
Sem mencionar seu nome, Bolsonaro reproduziu artigo da Lei
de Abuso de Autoridade que pune a divulgação indevida de gravações, forçando
uma acintosa associação do dispositivo com a límpida decisão do decano do STF.
Na segunda (25), o chefe do Executivo investiu contra a
credibilidade do procurador-geral da República, Augusto Aras, responsável por
acompanhar apurações, avaliar as provas colhidas pelos investigadores e
denunciar à Justiça os que tiverem seus crimes demonstrados.
Ao participar de um evento da Procuradoria por
videoconferência, Bolsonaro disse que gostaria de ir até Aras para
cumprimentá-lo pessoalmente. O
procurador aceitou recebê-lo em seu gabinete, onde posaram para fotos
e conversaram por alguns minutos.
Como não havia assunto sério que devesse ser tratado ali,
ficou evidente que o objetivo da encenação era intimidar o chefe do Ministério
Público, como Bolsonaro tinha feito semanas antes com o presidente do Supremo,
Dias Toffoli, ao marchar com empresários até o tribunal para uma visita
surpresa.
Nomeado por Bolsonaro para um mandato de dois anos, Aras só
foi indicado após demonstrar seu alinhamento com o presidente. Ele sabe que sua
recondução ao cargo em 2021 dependerá do que fizer durante as investigações em
curso.
O constrangimento é o resultado previsível do processo que
levou à escolha de Aras no ano passado, quando Bolsonaro buscou um nome fora da
lista tríplice indicada pelos membros do Ministério Público após sua eleição
interna, desprezando a tradição respeitada por seus antecessores.
Caberá ao procurador-geral demonstrar que é capaz de exercer
suas funções com independência e deixar em segundo plano suas conveniências
pessoais, examinando com rigor a conduta de Bolsonaro quando o inquérito em
andamento chegar a um desfecho.
Melhor ainda seria uma resposta legislativa às provocações
de Bolsonaro, que reforçasse a autonomia conferida pela Constituição ao
Ministério Público. Tornar a lista tríplice uma norma formal, restringindo a
liberdade de escolha —e a possibilidade de pressão posterior— dos mandatários,
representaria um valioso avanço institucional.
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