O presidente Jair Bolsonaro está dando munição contra ele
mesmo para o inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga a
denúncia do ex-ministro Sergio Moro de que ele tentou interferir nas ações da
Polícia Federal, e por isso demitiu o delegado Maurício Valeixo para nomear
Alexandre Ramagem, que foi chefe de sua segurança.
A insistência em nomear Ramagem, mesmo depois de o ministro
Alexandre de Moraes ter suspendido sua posse, só confirma o que Moro alegou
como motivo para sua saída do Ministério da Justiça.
O presidente Bolsonaro declarou que o caso quase gerou uma
crise institucional, indicando que pensara em não respeitar a decisão do
Supremo, ou em indicá-lo novamente, o que seria uma afronta ao Judiciário.
Ao mesmo tempo, duas investidas do presidente em outros
órgãos de Estado, como o Exército e a Receita Federal, demonstram que ele não
tem noção institucional dos limites que cada Poder tem entre si, e da diferença
das políticas de Estado das do governo.
Os órgãos de Estado não são braços da ação política dos
governos, são permanentes e devem ser guiados por atuação imparcial do ponto de
vista político. Bolsonaro determinou ao secretário da Receita Federal, José
Barroso Tostes Neto, uma anistia de dívidas tributárias das igrejas evangélicas
devido a autuações pelo não recolhimento de tributos na distribuição de lucros
e outras remunerações a seus principais dirigentes.
No Exército, ele determinou a revogação de três portarias
sobre rastreamento de balas e munições. Nos dois casos, agiu como presidente da
República para favorecer grupos de seguidores políticos, como as igrejas
evangélicas e os clubes de tiro, os atiradores e colecionadores de armas.
O que estava ruim só piorou para o presidente Bolsonaro com
o confronto que está alimentando com o Supremo Tribunal Federal (STF) por causa
da liminar do ministro Alexandre de Moraes que suspendeu a posse do delegado
Alexandre Ramagem na diretoria-geral da Polícia Federal. “Polícia Federal não é
órgão de inteligência da Presidência da República”, ressaltou o ministro do STF
em seu despacho concedendo a liminar.
Moraes atendeu a um pedido do PDT, que impetrou mandado de
segurança no STF usando como argumento as declarações do ex-ministro da Justiça
Sergio Moro sobre as tentativas do presidente da República de interferir
politicamente na PF, pois Ramagem tem ligações pessoais com os Bolsonaro.
Para determinar a suspensão, o ministro alegou que “em tese,
apresenta-se viável a ocorrência de desvio de finalidade do ato presidencial de
nomeação do Diretor da Polícia Federal, em inobservância aos princípios
constitucionais da impessoalidade, da moralidade e do interesse público”.
O presidente Bolsonaro, depois de ter tornado sem efeito a
nomeação de Ramagem, parece ter se arrependido e partiu para ataques pessoais a
Alexandre de Moraes. Acusou-o de ter adotado uma decisão politica, e ressaltou
que ele alegou “impessoalidade” para barrar a nomeação quando só teria sido
nomeado ministro do Supremo por ser amigo do ex-presidente Michel Temer.
Propositalmente, Bolsonaro se referiu à “impessoalidade”,
esquecendo-se de “moralidade” e do “interesse público”, que definem melhor a
decisão. Como era de se esperar, provocou um movimento de solidariedade interna
ao ministro Alexandre de Moraes, além de ter revelado um interesse exagerado na
manutenção da nomeação.
A liminar concedida nem tocou na questão da amizade entre
ele e Ramagem, mas sim na possibilidade de interferência na Polícia Federal. A
razão do deferimento da liminar no mandado de segurança foi a possibilidade de
haver um “desvio de finalidade” na nomeação, baseado nos relatos que o
exministro Moro fez ao deixar o cargo.
Quanto à permanência do delegado Alexandre Ramagem na Abin,
que Bolsonaro aponta como uma incoerência de Moraes, é preciso ressaltar duas
coisas: o mandado de segurança não pediu nada em relação à Abin, por isso o STF
não pode analisar. Além do mais, a Abin é órgão de assessoria de informação da
Presidência da República, e não do Estado, como a Polícia Federal. O presidente
pode nomear um amigo para o ministério, mas não para a PF ou outro cargo de
Estado.
O presidente da República no Brasil é ao mesmo tempo chefe
de Estado e chefe de governo. Mas é preciso saber não confundir as duas coisas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário