O presidente Jair Bolsonaro terá que trabalhar bem mais se
quiser ter uma base razoavelmente sólida no Congresso. Se já havia dúvidas
sobre a consistência do apoio de partidos movidos a prebendas estatais, como
mostraram derrotas dolorosas em algumas votações recentes na Câmara, agora a
aritmética também começou a jogar contra.
A anunciada saída do MDB e do DEM do chamado “blocão” –
associação de partidos comandada na Câmara pelo deputado Arthur Lira (AL),
líder do Progressistas e articulador informal dos interesses governistas –
reduzirá de 221 para 158 o número de parlamentares desse grupo que teoricamente
sustenta o governo. Isso não chega nem perto dos 172 votos necessários para,
por exemplo, impedir o avanço de um processo de impeachment.
No Congresso, partidos podem se juntar em blocos para um
propósito específico e esses blocos tendem a se desfazer quando o propósito
deixa de existir. O “blocão”, por exemplo, havia se formado no início do ano
para ganhar o maior espaço possível na Comissão Mista de Orçamento. Em tese,
uma vez alcançado esse objetivo, não fazia mais sentido a existência do
“blocão”, mas uma parte considerável dele permaneceu associada – inclusive o
MDB e o DEM – sob a liderança do deputado Arthur Lira.
Foi essa força que catapultou Arthur Lira à condição de
prócer governista, inclusive na negociação de cargos e verbas em troca de
apoio. Seu nome começou a ser considerado um dos favoritos à sucessão do
presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), em fevereiro do ano que vem. Para o
governo, seria uma equação perfeita: além de ter uma base de votos minimamente
articulada para pelo menos impedir o avanço de um processo de impeachment,
passaria a dispor também de um candidato bastante viável para presidir a Câmara
– cargo essencial na determinação do ritmo e das prioridades da agenda
legislativa.
Assim, embora se possa dizer que já fosse esperada, a saída
do DEM e do MDB do “blocão” ocorre num momento em que o governo imaginava ter
reunido munição suficiente para neutralizar o grupo liderado por Rodrigo Maia –
que não entrou na barca fisiológica do governo e que pretende ter forte peso na
sucessão da presidência da Câmara. Calcula-se que essa base influenciada por
Rodrigo Maia possa reunir até cerca de 270 votos – são necessários 256 para
eleger o presidente da Câmara.
Para piorar a situação governista, os deputados e partidos
que Rodrigo Maia pode arregimentar têm sido bem mais coesos e previsíveis do
que aqueles que supostamente apoiam o Palácio do Planalto. A votação da
renovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb),
comandada por Rodrigo Maia à revelia do governo, deixou clara essa diferença. O
deputado Arthur Lira, que buscou obstruir a votação, foi atropelado, e restou
ao presidente Jair Bolsonaro tentar transformar a acachapante derrota em
vitória, o que só tornou tudo muito mais constrangedor para o governo.
É evidente que a contabilidade de votos de hoje dificilmente
será a mesma de amanhã, dado que grande parte dos partidos só representa os
voláteis interesses de seus donos. Mas pode-se dizer que, quando partidos como
DEM e MDB sinalizam claramente que não querem ser identificados de nenhuma
maneira como base governista, é porque pressentem que essa proximidade é
eleitoralmente tóxica. No dizer do líder do DEM na Câmara, Efraim Filho, a
intenção do partido é ter “autonomia”: “Esse bloco (de Arthur Lira) permanece
com uma candidatura (à presidência da Câmara) mais ligada ao Planalto, e nós
pretendemos ter uma candidatura com um pouco mais de independência, ligada à
liderança de Rodrigo Maia”.
Assim, resta ao governo perceber o erro de pautar a sua relação com o Congresso, já tardia e mal ajambrada, exclusivamente pelo fisiologismo. Nessa base, dificilmente os articuladores governistas conseguirão evitar mais derrotas, porque as juras de apoio dos adeptos do toma lá dá cá são esquecidas assim que os ventos mudam – e, quanto pior a crise, mais caro será o preço do governismo.
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