Primeiro os deputados conquistaram o protagonismo com o
Orçamento impositivo e uma agenda de reformas econômicas. Deram, na sequência,
impulso a medidas emergenciais de combate aos efeitos da pandemia, por exemplo
com a adoção do Orçamento de guerra, e aprimoraram diversos dispositivos
enviados pelo presidente Jair Bolsonaro para tentar irrigar a economia com
crédito. Logo avançaram nas discussões sobre questões sociais e asseguraram a
prorrogação do Fundeb, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, a despeito das
resistências da equipe econômica. Agora, o risco do governo é ficar a reboque
da agenda ambiental da Câmara.
A administração Jair Bolsonaro tenta sair da defensiva,
desde que passou a ser alvo de duras cobranças de países aliados, parceiros
comerciais, empresários e investidores.
A má notícia, para o Palácio do Planalto e o Ministério do
Meio Ambiente, é que a reversão das péssimas expectativas em relação aos
resultados de suas ações para conter o desmatamento ilegal só se dará com a
apresentação de dados positivos e confiáveis. No entanto, as estimativas de
autoridades que acompanham de perto o assunto não são animadoras.
Espera-se que os dados de desmatamento de 2020 superem os
observados no ano passado, quando satélites do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe) captaram sinais de derrubadas na Amazônia em áreas que
ultrapassaram 9 mil quilômetros quadrados. Um aumento de aproximadamente 85% em
relação a 2018.
Segundo essas fontes, deve haver uma desaceleração neste ano
e os números não serão tão ruins quanto os projetados num primeiro momento, mas
certamente apontarão crescimento do desmate ilegal. Tudo indica que as
autoridades do governo não conseguirão apresentar o balanço de dezembro com
sorriso no rosto.
Existe, por outro lado, uma mudança conjuntural tanto na
visão de setores do governo quanto no Congresso. A bancada ruralista, que
muitas vezes interditou a tramitação de propostas advogadas pelos
ambientalistas, percebeu que o tema é vital para os negócios de seus
representados.
Parlamentares com boas conexões no meio empresarial e no
mercado financeiro decidiram se mobilizar. Todos se deram conta de que
investidores – nacionais e estrangeiros – exigem uma safra de boas notícias
para poderem recolocar o país como destino preferencial em seus portfólios.
O governo tem o que apresentar, mas, para seu desassossego,
parece não ter mais audiência. O ministério lançou um programa de pagamento por
serviços ambientais e quer estimular o mercado de crédito de carbono.
A Operação Verde Brasil 2 ocorre desde maio e seu mais
recente balanço contabiliza a apreensão de 28 mil metros cúbicos de madeira, 93
tratores, 85 máquinas de mineração, 259 embarcações e 174 veículos. Os
equipamentos, segundo o vice-presidente Hamilton Mourão, presidente do Conselho
da Amazônia, serão destinados para as prefeituras da região. Foram aplicados
cerca de R$ 407 milhões em multas.
Essas medidas, embora no caminho correto, foram adotadas
tardiamente. E setores do governo permanecem apostando no enfrentamento.
O próprio presidente da República responsabiliza a Câmara
por parte do fracasso da sua agenda para o setor. Sempre que pode, lembra: os
deputados não votaram a medida provisória que tratava da regularização
fundiária, uma proposta considerada fundamental pelo governo para reduzir as
ilegalidades na Amazônia e responsabilizar empresas e proprietários por
queimadas e derrubadas ilegais. A Câmara tentará votar um projeto de lei com
teor semelhante.
No Palácio do Planalto, existe a visão de que está em curso
um complô internacional contra a autoridade do Brasil sobre a Amazônia, uma
ação orquestrada visando consolidar a imagem de que a região está abandonada e
o governo não consegue cuidar da floresta.
Acredita-se que isso se deve, em parte, às sinalizações de
que os recursos federais e as verbas obtidas no exterior devem ser destinados
prioritariamente às ações de repressão e controle – e não para projetos
conduzidos por organizações não governamentais (ONGs).
Com o Congresso entrando para valer no debate, certamente
visões antagônicas ganharão mais peso. Os governadores e as bancadas amazônidas
serão mais ativos. Isso faz parte do embate democrático e a base aliada terá
que mostrar força.
Entre as duas Casas do Legislativo, a Câmara dos Deputados
novamente largou na frente. Já está construindo uma ponte com o setor privado
e, além de um projeto sobre regularização fundiária, tentará aprovar um marco
regulatório para o licenciamento ambiental. Pode entrar também no radar uma
proposta com diretrizes para a proteção do bioma marinho.
No Senado, o presidente Davi Alcolumbre (DEM), do Amapá, tem
interesse direto nas discussões por ser de um Estado da região e também defende
a priorização da regularização fundiária.
Diante do fato de que a agenda ambiental passou a fazer
parte das áridas relações entre o Executivo e o Legislativo, um bom começo
seria os dois Poderes evitarem a armadilha de transformar essa pauta em um novo
fator gerador de fricções institucionais. Espera-se, por exemplo, que o
Congresso aprove rapidamente o projeto de lei de abertura de crédito
suplementar em favor da Operação Verde Brasil 2, por meio do qual o governo
pretende destinar R$ 410 milhões ao Ministério da Defesa.
Nesse mesmo sentido, embora seja uma iniciativa legítima do Parlamento, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o trabalho das agências e das autoridades federais ambientais certamente fomentaria novos atritos. Essa possibilidade não é vista hoje como algo exequível, mas não é descartada por parlamentares influentes no caso de o governo não atacar de maneira satisfatória o problema do desmatamento ilegal.
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