Em meio à tragédia da pandemia do novo coronavírus, discute-se
intensamente o que virá depois da covid-19. Existem várias dimensões nesse
debate, do cotidiano doméstico ao novo mundo das inovações tecnológicas, mas a
política não perdeu centralidade. Destaco as eleições nos Estados Unidos e a
escolha do novo comando do nosso Congresso, principalmente da Câmara dos
Deputados. Nosso futuro imediato dependerá muito desses dois eventos.
A pandemia de coronavírus colocou em xeque a reeleição do
presidente Donald Trump, republicano, no pleito de 3 de novembro. Joe Biden,
vice-presidente de Barack Obama, hoje lidera a disputa com uma vantagem de 14
pontos. Trapalhadas no combate à pandemia e a recessão jogaram Trump para
baixo. A sua esperança é a recuperação da economia em V, mas o coronavírus se
espalha por todo o território e Trump terá mais dificuldades. Além disso, a
violência policial, que estimulou, provocou forte reação da sociedade,
principalmente dos jovens.
Os sinais de que a recuperação acelerada da economia
norte-americana seria possível vinham da China, após dominar a pandemia, e
também da Alemanha, que segue a mesma trajetória, o que ainda pode se
reproduzir em outros países da Europa com economias fortes, principalmente a
Inglaterra e a França. Entretanto, a projeção do PIB dos EUA aponta para uma queda
de 6,5% em 2020.
A disputa comercial entre os Estados Unidos e a China pelo
controle das cadeias de comércio mundiais, cujo eixo se deslocou para o
Pacífico, pauta a política mundial. Com a eventual derrota de Trump, não
deixará de existir, mas sofrerá mudança radical na forma de atuação dos Estados
Unidos. A política de Trump tensiona as relações do Brasil com a China, nosso
principal parceiro comercial, porque a atual política externa é esquizofrênica:
o alinhamento automático com os EUA está em contradição com nosso lugar na
divisão internacional de trabalho. Por isso mesmo, a eventual derrota de Trump
terá reflexos na nossa política externa. Como os democratas, hoje, têm melhores
relações com a oposição, isso acabará influenciando o governo Bolsonaro.
Sucessão
Vamos à política interna. Nossas eleições municipais serão
em 15 de novembro. É pouco provável que a polarização política nacional se
reproduza em nível municipal, embora seja previsível o surgimento de candidatos
bolsonaristas na maioria dos municípios. Entretanto, a recíproca não é
verdadeira: os resultados das eleições municipais repercutirão fortemente na
política nacional, principalmente no Congresso.
Depois do tsunami de 2018, que promoveu grande renovação no
Congresso, nossa elite política reagiu com muito protagonismo, principalmente
nas reformas econômicas. Resgatou para si o grande jogo da política, enquanto o
presidente Jair Bolsonaro se enredava na pequena política. Foi uma inversão de
tendências, pois sempre coube ao Executivo a iniciativa de reformar o Estado e
a economia. Muito desse protagonismo se deve ao desempenho do presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cujo mandato está acabando, não pode ser
reeleito nem tem um sucessor consolidado para o cargo.
É aí que o presidente Jair Bolsonaro pode passar da defensiva à ofensiva em relação ao Congresso. A intenção dos militares que ocupam o Palácio do Planalto, principalmente do ministro da Secretaria de Governo, o general Luiz Ramos, é conquistar o comando da Câmara via articulação com o Centrão: PP (40 deputados), PL (39), PSD (36), Republicanos (31), Solidariedade (14), PTB (12), PROS (10), PSC (9), Avante (7) e Patriota (6). Por ora, o governo joga com pau de dois bicos: Arthur Lira (PP-AL), o preferido do “baixo clero”, e Marcus Pereira (PP-S), bispo da Igreja Universal e atual vice-presidente da Casa. O MDB (34), o DEM (28) e o PSDB (31), apesar da liderança de Maia, ainda não têm um candidato competitivo, que possa dividir o Centrão e obter votos da oposição, para manter a autonomia da Casa.
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