Jair é um fenômeno, não?
Porque é surpreendente como alguém com sua obra, sua
história política tenha chegado ao poder e, mesmo depois de seus inúmeros e
tresloucados atos nesse um ano e meio de governo, ainda possua apoio de uma
significativa parcela da população.
Um político que nunca escreveu um livro, nunca teve um
projeto relevante aprovado, nunca uniu multidões, tenha sido catapultado ao
cargo mais alto da Nação e ali se mantenha firme e forte.
O despreparo assumido do presidente é assunto de constantes
reportagens, artigos, vídeos, vlogs, posts e twits.
Por exemplo, em seu canal no YouTube, meu vizinho de ISTOÉ, o professor Marco
Antonio Villa, com mais de 600 mil assinantes, faz um trabalho incansável,
diário, de lembrar os absurdos do governo e de nosso líder maior.
Mas nada faz o ponteiro do bom senso nas pesquisas se mover dos 30% de apoio
que o mandatário recebe.
Seus apoiadores são impermeáveis a qualquer argumento.
Talvez num breve apanhado de seu currículo possamos
encontrar a origem de tão inequívoco apoio.
Quem sabe a carreira militar do terceiro presidente das Forças Armadas eleito
por voto popular o aproxime dos outros dois, Hermes da Fonseca e Dutra,
respeitados na caserna.
Não é o caso.
Aos 33 anos nosso Messias foi aposentado, em sua breve
carreira no Exército, por ter elaborado um plano para explodir bombas-relógios
em quartéis, lutando por melhores salários.
Atitude que o nivela à mesma postura anticonstitucional que
costuma acusar seus inimigos políticos da esquerda.
Quem sabe tenha tido uma vida política de conquistas, tal qual um Tancredo
Neves, ou um Ulisses Guimarães.
Não é o caso.
Ao longo de seus 26 anos de carreira política, o então
vereador, depois deputado, apresentou 172 projetos.
Um deles propunha que Enéas Carneiro fosse incluído na relação de Heróis da
Pátria, para se ter ideia do nível de irrelevância.
Dos projetos votados, apenas dois foram aprovados, o que
comprova que nunca se destacou pela defesa dos interesses da população.
Quem sabe sua popularidade se deva ao apoio incondicional de
um partido político ou agremiação, como foi o caso de Lula e o PT.
Não é o caso.
Mesmo aposentado, Bolsonaro apresentou 53 projetos
defendendo interesses dos militares. Nenhum foi aprovado.
No baixo clero, onde sempre transitou, Bolsonaro passou pelo PPB, PDC, PPR,
PFL, PTB, PP, PSC e PSL, até sua condição atual de sem partido.
Quem sabe talvez tenha sido sua retórica, ou talento de
orador, como um Brizola, por exemplo.
Não é o caso.
Bolsonaro, antes da eleição, era quase uma anedota de mau
gosto, ao apoiar os mais controversos temas, como a homofobia (“…prefiro que um
filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí.” — 2011);
atacar colegas do Congresso como Maria do Rosário; apoiar torturadores como
Brilhante Ustra e por aí vai.
Quem sabe seja sua intelectualidade. Uma espécie de FHC. Talvez Bolsonaro seja
um sociólogo amador, um psicólogo autodidata, um economista diletantista.
Não é o caso
Durante a campanha deixou claro inúmeras vezes que não
entende de nenhum assunto e que confiaria nos ministros especialistas.
“Minha especialidade é matar — (2017)”, foi à única
indicação de que domina alguma área do conhecimento humano.
Apesar disso, demitiu diversos ministros especialistas que
discordavam de sua própria ignorância.
Quem sabe seja o caso de admitirmos a mais terrível das
opções.
A de que somos um povo tacanho, ignorante, preconceituoso e
incapaz sequer de reconhecer o despreparo de quem nos lidera.
O peixe, afinal, é o último a reconhecer o aquário.
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