Nos primeiros meses do governo Bolsonaro, quando a cada
semana um novo olavista aparecia, uma nova nuance do extremismo vinha à tona,
os generais da reserva com cargo na Esplanada faziam questão de ressaltar em
conversas privadas que as Forças Armadas eram as Forças Armadas e o governo é o
governo. Admitiam que uma eventual falha de Bolsonaro seria cobrada dos
militares, mas defendiam que não eram uma coisa só. Era uma vacina diante do
que aos poucos ficava cada vez mais claro: seria impossível controlar
Bolsonaro. Quando os militares metidos na política — o então comandante do
Exército, Eduardo Villas Bôas, e os generais reformados Augusto Heleno e
Hamilton Mourão, entre outros — perceberam a viabilidade da candidatura do
então ex-capitão amalucado, em 2018, e decidiram embarcar naquela aventura,
tomaram essa decisão porque entenderam que poderiam colocar rédeas naquele
ex-capitão, que nunca havia tido expressão como militar nem como deputado.
Afinal, seriam generais bem formados, experientes, que, na visão deles,
facilmente manietariam Bolsonaro. Não só era uma tremenda ilusão como o
contrário está aos poucos ocorrendo: o bolsonarismo está contaminando os
generais.
O radicalismo de alguns deles, Augusto Heleno à frente,
ficou evidente já no ano passado. O chefe do Gabinete de Segurança
Institucional misturou-se de tal forma com a ala mais radical do governo,
retroalimentando-se do extremismo, que causou estranheza ouvi-lo falar há
alguns dias em moderação e distensionamento. Seguindo a toada do momento, do
Jairzinho paz e amor, Heleno deu um cavalo de pau, deixando de lado todo o
tensionamento para o qual ele contribuiu nos primeiros 18 meses do governo. Se
de fato se acalmar, melhor para o país. Mas o risco maior do momento é outro.
Os fatos apontam que os generais parecem estar se
contaminando por outro sintoma terrível do bolsonarismo, que nunca é demais
lembrar, sempre bebeu na água do fisiologismo da política do Rio de Janeiro —
as rachadinhas de Queiroz são a evidência mais concreta disso.
A indicação de militares para cargos no governo só por serem
militares é fisiologismo também. Mas o problema está ficando ainda pior.
O repórter Robson Bonin mostrou que a filha do general
Walter Braga Netto, chefe da Casa Civil, chegou a colocar um pé na Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS), enquanto seu pai emprega no Planalto o
irmão do diretor da ANS que seria seu chefe. A luz do sol foi bem-vinda e
Isabela Braga Netto recuou. Foi o único recuo.
Adriana Villas Bôas, filha do ex-comandante do Exército e
até hoje assessor no GSI, Eduardo Villas Bôas, já está no segundo emprego no
Ministério dos Direitos Humanos. Almir Garnier Santos Junior, filho do
secretário-geral do Ministério da Defesa, Almir Garnier Santos, almirante de
esquadra da Marinha, foi contratado para um cargo na Empresa Gerencial de
Projetos Navais (Emgepron), uma empresa pública subordinada à Marinha. O
secretário-geral é o “número dois” da Defesa. Na quinta-feira 23, a repórter
Berenice Seara revelou mais um caso: Stephanie dos Santos Pazuello foi nomeada
na prefeitura de Marcelo Crivella, o prefeito hoje mais próximo da família
Bolsonaro. Stephanie é filha do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.
Todos podem ter bons currículos, mas a pergunta que fica é:
teriam sido contratados se não fossem filhos de generais e de um almirante?
Talvez sim. Poderiam buscar empregos em outras áreas que não no governo em que
os pais atuam ou de aliados do chefe dos pais? Certamente. Teria sido melhor
para as imagens dos próprios e principalmente para as Forças Armadas. Como não
o fazem, vai ficando cada vez mais difícil de acreditar que não há uma
associação entre os fardados e o presidente — o que é fundamental para Bolsonaro,
mas péssimo para a reputação deles.
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