Em uma reportagem que merece entrar para os manuais de
jornalismo investigativo, a Rede Globo revelou nesta semana que o prefeito do
Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, tem jagunços pagos com dinheiro público, cuja
missão é impedir que seus fracassos na gestão da Saúde virem notícia.
Eles chamam a si mesmos Guardiões do Crivella, como se
fossem um time de super-heróis da Marvel, mas o trabalho é barra pesada.
Normalmente aos pares, ficam de tocaia na entrada de hospitais, fingem ser
pessoas comuns e interrompem a gravação de reportagens abordando de forma
agressiva entrevistadores e entrevistados, ou berrando palavras de ordem – em
geral, de apoio a Jair Bolsonaro. O presidente, aliás, é unha e carne com o
grupo político e religioso (e televisivo) Crivella, que é o mesmo do bispo Edir
Macedo.
A interferência no trabalho dos repórteres atenta contra a
liberdade de imprensa, o que já é inaceitável. Mas trata-se também de
constranger gente comum, que não consegue atendimento na rede municipal e
aceita falar às câmeras de televisão porque precisa de ajuda. Os capangas de
Crivella são funcionários públicos que todos os dias saem de casa para agredir
os cidadãos aos quais deveriam servir.
A filosofia por trás desse esquema é igual à que inspira a
rede de bullying e fake news que o bolsonarismo criou nas redes sociais. Nos
dois casos, o propósito é turvar as águas do debate público. O método do
prefeito, no entanto, impressiona pela crueza e descaramento. Um de seus
assessores mais próximos comanda a equipe de brucutus de dentro do Palácio da
Cidade.
Há pouco mais de um ano, a renovação de um contrato de
mobiliário urbano serviu de pretexto para a abertura de um processo de
impeachment contra Crivella. Como é comum nesses processos, o contexto
importava mais do que o pretexto. A verdadeira razão da caçada ao prefeito era
sua inépcia no trato com a Câmara dos Vereadores.
Depois do susto, Crivella conseguiu normalizar sua relação
com os políticos municipais. Embora continue com níveis baixos de aprovação,
devido à incompetência na administração da cidade, não viu as ameaças de
impeachment se renovarem. Agora, no entanto, ele é flagrado numa história em
que o desvirtuamento do mandato público é escancarado. Os vereadores do Rio de
Janeiro terão de dizer se compactuam com essa podridão.
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