terça-feira, 25 de maio de 2021

AGRONEGÓCIO NÃO TEME O PT

Andrea Jubé, Valor Econômico

Agronegócio não teme o PT, diz Wagner

Enquanto a CPI da Covid concentra os holofotes e tensiona o ambiente político, avançam nos bastidores as articulações em torno de outro ecossistema: o meio ambiente e a agenda fundiária.

O Senado pode retomar nos próximos dias a votação do projeto de regularização de terras públicas, retirado da pauta há um mês após pressão dos ambientalistas.

O mesmo grupo tenta impedir que o controvertido projeto que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental aprovado há dez dias pelos deputados comece a tramitar no Senado.

Na semana passada, o presidente da Comissão de Meio Ambiente, senador Jaques Wagner (PT-BA), recomendou ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que não coloque a proposta em pauta.

Questionado se pretende promover audiências públicas sobre a matéria na comissão, Wagner respondeu à coluna que gostaria que o projeto nem tramitasse na Casa. “Aquilo é um absurdo, espero que não avance. É um direito do presidente não pautar, ele reúne o colégio de líderes, comunica que não vai pautar”, propõe o senador.

Há um mês, o petista também articulou junto com a bancada do partido e grupos de ambientalistas a retirada de pauta do projeto de lei do senador Irajá Abreu (PSD-TO) de regularização fundiária, inspirado em medida provisória que caducou na Câmara há um ano.

O projeto estende para todo o país as normas hoje restritas à Amazônia Legal, amplia até 2012 o marco temporal para a comprovação da ocupação da terra, e abrange propriedades com até 2,5 mil hectares.

Para Wagner, o projeto é um “retrocesso” porque não seria necessária uma nova legislação para regularizar a terra pública em poder dos pequenos proprietários. Alega que se o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) tivesse estrutura, poderia regularizar 85% dessas propriedades com base no programa Terra Legal, de 2009.

“É impróprio tratar disso neste momento em que o Brasil está na contramão do mundo na área ambiental. Isso é cavalo de Troia para outros interesses”.

Wagner reconheceu, entretanto, que o relator da matéria, senador Carlos Fávaro (PSD-MT), mostrou disposição ao debate, acompanhou as audiências públicas das comissões de Agricultura e de Meio Ambiente, e, no fim, concordou em rever pontos polêmicos do relatório.

À coluna, Fávaro ponderou que não quer politizar o assunto. “Não se trata de uma lei do governo Lula ou do governo Bolsonaro, nosso objetivo é avançar para entregar uma legislação mais moderna e efetiva”. Representante de um Estado vocacionado ao agronegócio, Fávaro argumenta que se a lei em vigor bastasse, não existiriam “300 mil famílias à espera do título de suas terras, que dependem do documento para fazer financiamento, comprar equipamentos”.

Para viabilizar a retomada da discussão e votação do projeto, Fávaro concordou em rever quatro pontos de seu relatório, e antecipou um deles à coluna: vai suprimir o dispositivo que definia infração ambiental como conduta lesiva ao meio ambiente comprovada somente após o esgotamento das vias administrativas. O item foi um dos que mais geraram dúvidas e controvérsia na discussão da matéria.

À frente da Comissão de Meio Ambiente, Jaques Wagner relata que tem mantido canal aberto de interlocução com lideranças do agronegócio, e que muitos produtores estão conscientes de que as pautas que implicam risco ambiental não interessam a eles.

“É a pauta dos imediatistas, querem arrombar a porteira, mas depois não terão com quem comercializar os seus produtos. Sabem que não adianta produzir aqui se a imagem lá fora é de que foi produzido em cima de degradação”.

Descarta que lideranças do agronegócio, segmento que apoia majoritariamente o presidente Jair Bolsonaro, temam a eventual vitória nas eleições do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela retomada das invasões do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).

“Desconheço esse medo”. O senador afirma que tem dialogado intensamente com produtores rurais, agora com mais frequência por causa da presidência do colegiado, e não sente esse receio. Acrescenta que mantém conversas com produtores rurais na Bahia, e nunca sentiu essa resistência ao PT, que governa o Estado há 15 anos. “Na Bahia tem algodão, tem soja, tem frango, tem uma porção de coisas, se eles têm medo da gente, é descabido”.

Sobre o MST, Wagner defende um ponto de equilíbrio. “A gente não vai querer que ninguém fique ocupando terra produtiva, assim como não quero que o agronegócio fique degradando ou desmatando. Os movimentos sociais vão conviver com a gente enquanto tiver discrepância social, isso não depende do Lula”.

O petista também quer dialogar com o governo sobre hidrogênio verde, e vai procurar o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, para tratar do tema, que já começou a debater com empresários baianos e alemães, e está na ordem mundial.

“O Brasil tem tudo para produzir hidrogênio verde: temos biomassa, água salgada, água doce, energia limpa.

O tema está no radar do governo. Em abril, Albuquerque foi um dos palestrantes do 1º Congresso do Hidrogênio para a América Latina e o Caribe. O setor privado está fechando negócios no Brasil. O grupo australiano Fortescue assinou memorando de entendimento com o Porto do Açu, no Rio de Janeiro. A também australiana Enegix Energy e o governo do Estado do Ceará deram os primeiros passos para estabelecer um “hub de hidrogênio verde” no Porto de Pecém.

Wagner descarta convite ou convocação do ministro Ricardo Salles, alvo de investigação da Polícia Federal por suspeita de exportação de madeira ilegal. “Não sou empolgado com isso, a gente fica no bate-boca, ele só fala o que quer, e não resolve nada. Se tiver denúncia, melhor deixar para o Ministério Público investigar, prefiro as audiências públicas, que são mais esclarecedoras”.

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