Em sua primeira aparição como ministro da Ciência no principal evento científico do país —a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em 2019—, o astronauta Marcos Pontes fez sua tradicional palestra motivacional. Sobre ciência, falou pouco. E manteve essa toada em toda a sua gestão.
Na época da conferência, o governo flertava com o negacionismo. Bolsonaro tinha acabado de atacar o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) —instituição de ponta que tem parceiros como a Nasa— por causa dos dados de desmatamento na Amazônia. Pontes não entrou no embate, como quem observa de um planeta distante. O diretor do instituto, Ricardo Galvão, foi exonerado.
O astronauta acompanhou colegas ministros e o próprio presidente criticarem recorrentemente as universidades públicas, responsáveis por 90% da ciência brasileira. Disseram que elas faziam balbúrdia. Viu o orçamento da sua pasta despencar ao passo que países com cultura científica forte ampliaram investimentos em pesquisa para combater o coronavírus.
Fez um ou outro anúncio capenga, como o de uma droga "secreta" contra a Covid com bons resultados em células. Era a nitazoxanida, um antiparasitário. Não deu em nada, como a maioria dos experimentos in vitro (que, por isso, raramente são publicizados). Depois, prometeu para o final deste ano a primeira vacina nacional contra Covid (que está em testes, então não sabemos se vai dar alguma coisa).
Viu seu chefe correndo com cloroquina na mão atrás de uma ema e gastando recursos públicos —escassos na sua pasta— para comprar a droga sem comprovação contra Covid. Viajou, vestiu-se de astronauta e tirou fotos com crianças em uma espécie de campanha permanente. Por fim, deixou o cargo para concorrer à Câmara. A preocupação parecia ser, apenas, manter-se ministro. Deu certo para ele, mas não para a ciência brasileira.
Sabine Righetti
É jornalista, doutora em política científica e pesquisadora no Labjor-Unicamp. Fundou a Agência Bori
Nenhum comentário:
Postar um comentário