domingo, 15 de maio de 2022

ALTA ROTATIVIDADE

Editorial O Estado de S.Paulo

Para quem acompanha o modus operandi de Jair Bolsonaro, a demissão do agora ex-ministro de Minas e Energia almirante Bento Albuquerque não é exatamente uma surpresa. Como se tornou praxe em seu governo, o presidente não demite aliados por escândalos, frases infelizes ou incompetência, mas apenas para dar satisfação à sua base eleitoral. Não foi por acaso que Albuquerque foi dispensado, sem qualquer anúncio público prévio, dois dias após a Petrobras anunciar um novo aumento nos preços do diesel. São atitudes como esta que permitem a Bolsonaro alimentar, entre seus seguidores, a fantasia do “mito” que luta contra o “sistema”.

Há um mês, após criticar o lucro “excessivo” da companhia, Bolsonaro demitiu Joaquim Silva e Luna da presidência da Petrobras. Foi Albuquerque, não Bolsonaro, quem comunicou ao general que ele havia sido dispensado. Na época, o almirante perdeu força ao defender a indicação de Adriano Pires para o comando da companhia e a de Rodolfo Landim para o Conselho de Administração, ambos eivados de conflitos de interesses. Foi no volúvel apoio do Centrão que o almirante apostou para manter os nomes escolhidos. O episódio gerou tamanho desgaste – nunca esquecido por Bolsonaro e atribuído unicamente a Albuquerque – que a solução foi substituir todos, inclusive o ministro. A exemplo de seus antecessores, e como não poderia deixar de ser, o novo presidente da Petrobras, José Mauro Ferreira Coelho, tem mantido a política de preços da companhia. Demitir o executivo um mês depois de sua posse certamente teria um custo muito alto para a Petrobras. Dessa vez, coube a Albuquerque pagar o preço político pela fidelidade canina a Bolsonaro.

Se o almirante já faz parte do passado, ainda não se sabe o que o economista Adolfo Sachsida estará disposto a fazer para se sustentar à frente do Ministério de Minas e Energia (MME). É impossível impedir que os preços de gasolina e diesel subam quando o País é importador líquido de derivados e o câmbio permanece desvalorizado em razão dos recorrentes erros da política econômica. O governo tampouco pode fazer algo para impedir a escalada das cotações do barril de petróleo no exterior em meio a uma guerra entre Rússia e Ucrânia. Da mesma forma, cancelar os reajustes nas contas de luz neste ano, como quer a Câmara dos Deputados, e antecipar receitas que a Eletrobras pagaria ao longo de 25 anos após a privatização, como defende a equipe econômica, lembram o malabarismo da administração da ex-presidente Dilma Rousseff, que quase levou as duas empresas públicas à ruína. O que Bolsonaro quer, no fundo, é adotar uma política populista e intervencionista, exatamente o contrário do que Sachsida, que se diz liberal, costuma defender em entrevistas.

Era de Sachsida, na condição de secretário especial do Ministério da Economia, a tarefa de levar ao mercado projeções otimistas, para dizer o mínimo, sobre os indicadores da economia. É fato que ele é visto como braço direito de Paulo Guedes e já declarou considerá-lo o “melhor ministro da Economia da história do Brasil”. Há quem veja que a sintonia entre os dois pode ajudar a trazer mais realismo às políticas setoriais do governo. Mas também é verdade que Sachsida, ainda como pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), se aproximou do então deputado Jair Bolsonaro mais de um ano antes de sua eleição, instruindo o ainda pré-candidato sobre economia em encontros semanais. Foi Sachsida quem previu como “baixíssima” a probabilidade de uma segunda onda de covid-19 no País, e foi com base em sua avaliação que o governo achou por bem não prorrogar o auxílio emergencial para a parcela mais vulnerável da população, deixando famílias desassistidas por meses. Foi o mesmo Sachsida quem perdeu o cargo de assessor especial do Ministério da Educação durante a gestão Michel Temer, horas após a descoberta de que ele apoiava o movimento “Escola sem Partido”. É a Bolsonaro, não a Guedes, que é atribuída a presença de Sachsida na equipe econômica. Qual de suas personas vai comandar o Ministério de Minas e Energia?

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