sexta-feira, 15 de julho de 2022

SUPREMO ACUADO

Da ISTOÉ

Para contornar estresse com Planalto, Supremo deve evitar decisões mais polêmicas

Estimular na população e entre congressistas o sentimento de desconfiança sobre o Supremo Tribunal Federal é uma das estratégias-chave de Jair Bolsonaro para pavimentar o caminho para uma ruptura institucional. Não à toa, há dois anos, o presidente repete incessantemente que a corte extrapola os próprios poderes e não o deixa governar, além de acusar ministros “linha-dura” de atuarem nos bastidores para emplacar Lula no Palácio do Planalto. Com a tática, o capitão contribuiu para um isolamento gradual do tribunal. Para evitar o agravamento do quadro, a menos de três meses das eleições, integrantes do Supremo pregam ser esse o momento de “escolher as brigas” para “não esticar a corda”.

A tendência é que a posição seja externada quando caírem nas mãos de ministros processos relacionados a temas que despertaram polêmica no Congresso ao longo das últimas semanas e que têm impacto sobre a campanha de Bolsonaro. Um dos “testes de fogo” será a CPI do MEC, cuja instalação, em tese, ficará para depois das eleições graças a um acordo entre as lideranças. Na oposição, está sacramentada a decisão de acionar o Supremo para tentar obrigar os partidos a indicarem já em agosto os membros da comissão que pretende investigar o balcão de negócios do Ministério da Educação e a interferência do presidente na Operação Acesso Pago, que culminou na prisão do ex-ministro Milton Ribeiro e de pastores-lobistas, soltos posteriormente por ordem do desembargador Ney Bello.

Senadores ainda avaliam qual o melhor timing para mover a ação. Por ora, os parlamentares entendem que seria mais “adequado” protocolar o processo depois do recesso do Judiciário, quando nomes como Luís Roberto Barroso, que decretou a instalação da CPI da Covid, e Edson Fachin, estarão de volta das férias. Seja em qual momento for, no Supremo, a expectativa é de que a liminar seja negada ou “esquecida nas gavetas”. Seria uma forma de manter a paz com o Senado — no mês passado, em uma reunião com Luiz Fux, Rodrigo Pacheco chegou a reclamar do número de decisões monocráticas do tribunal, fazendo menção a que determinou a abertura da comissão que investigou as ações e omissões do governo na pandemia.

Se provocado, o Supremo também não reconhecerá a inconstitucionalidade da “PEC Kamikaze”, aprovada pela Câmara na quarta-feira e encaminhada à promulgação. No Congresso, a própria oposição reconhecia que, se chancelado pelo plenário o pacote social de R$ 41,2 bilhões voltado à ampliação do Auxílio Brasil e à criação de um benefício mensal de R$ 1 mil para caminhoneiros, seriam remotas as chances de a corte derrubá-lo por dois motivos: haveria uma afronta ao “sentimento majoritário” do parlamento e a decisão serviria de munição para Bolsonaro.

É o sinal mais latente do cálculo político do Supremo. A PEC rasga a legislação eleitoral, que proíbe a criação ou ampliação de benefícios sociais no ano do pleito. Para livrar o governo das amarras, o Congresso até decretou o “estado de emergência”, mas, nos corredores, a maioria dos parlamentares admite que a justificativa — a crise do petróleo — é totalmente casuística, já que a disparada dos preços se arrasta há mais de um ano, o que configura desvio de finalidade. O drible na legislação, assim, torna a matéria ainda mais inconstitucional, cria uma bomba fiscal e abre um precedente perigoso para os próximos governos. Bolsonaro espera, também, que os casos mais polêmicos caiam nas mãos dos ministros escolhidos por ele, Kassio Nunes e André Mendonça.

“PEC Kamikase” rasga a legislação eleitoral, que  proíbe a criação  de benefícios sociais no ano do pleito, mas STF não deve barrá-la

Indulto a Silveira

Em outra ponta, o Supremo também deixou amornar a polêmica em torno do indulto concedido por Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira, condenado a oito anos e nove meses de prisão e à consequente suspensão dos direitos políticos por ataques às instituições. O parlamentar já avisou que vai registrar a candidatura ao Senado junto ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio. A estratégia do STF é deixar que a inelegibilidade dele seja avaliada pela primeira instância e, possivelmente, pelo TSE, em caso de recurso.

O STF pretende jogar parado porque a jurisprudência indica que, embora o perdão presidencial livre os agraciados da punição criminal, ele não alcança a seara eleitoral. “O indulto presidencial não equivale à reabilitação para afastar a inelegibilidade decorrente de condenação criminal, o qual atinge apenas os efeitos primários da condenação – a pena, sendo mantidos os efeitos secundários”, anotou o relator do processo no STF, Alexandre de Moraes, ainda em abril.

A corte entende que a autocontenção se tornou imprescindível neste momento para “evitar um mal pior”. Mas, ao bambear, o STF demonstra o quão deteriorada está a democracia brasileira. Para além disso, não há como o armistício durar muito — a corte precisará responder à altura dos ataques que vai sofrer nos atos bolsonaristas de 31 de julho e Sete de Setembro. Caso contrário, o Planalto entenderá que conseguiu curvar o Judiciário.

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