Segundo a PF, estivemos muito próximos de um golpe
militar. Foram dois anos de investigações, encerradas ontem, para chegar a
Bolsonaro e aos militares
O ex-presidente Jair Bolsonaro; o ex-ministro da Justiça
Anderson Torres; o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
Augusto Heleno; o ex-ministro da Casa Civil e da Defesa Walter Souza Braga
Netto; o ex-ministro da Defesa e ex-comandante do Exército Paulo Sérgio
Nogueira de Oliveira; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos; o
ex-diretor da Agência Brasileira de Informações (Abin) Alexandre Ramagem; o
ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército e general de Exército Estevam
Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e
tenente-coronel do Exército Mauro Cid, e o presidente do PL, Valdemar Costa
Neto, estão entre os 37 indiciados pela Polícia federal (PF) por tentativa de
golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023.
Conforme o relatório encaminhado ao Supremo
Tribunal Federal (STF), estão indiciados pelos crimes de abolição violenta do
Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa. São
acusados de atuar coordenadamente para evitar que o então presidente eleito,
Luiz Inácio Lula da Silva, e seu vice, Geraldo Alckmin, assumissem o governo,
sucedendo ao então presidente Jair Bolsonaro, derrotado nas últimas eleições
presidenciais, em 2022. O relatório mostra, inclusive, que havia um plano para
matar Lula, Alckmin e o então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE),
ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito.
Segundo a PF, estivemos muito próximos de um golpe militar.
Foram dois anos de investigações, encerradas ontem, para chegar a Bolsonaro e
aos militares de seu estado-maior, entre os quais, cinco oficiais de quatro
estrelas, que ocuparam o topo da cadeia de comando das Forças Armadas: dois
ex-ministros da Defesa, o chefe da Segurança Institucional; o comandante da
Marinha e o comandante de Operações Terrestres do Exército. Outros ocupantes de
posições estratégicas nos órgãos de coerção do Estado brasileiro também estavam
envolvidos: o ministro da Justiça e o chefe da Agência Brasileira de
Informações (ABIN).
Somente não atingiram seus objetivos porque houve uma
atuação muito firme do Supremo Tribunal Federal (STF), principalmente do
ministro Alexandre de Moraes e da ministra Rosa Weber, ex-presidente da Corte.
Também faltou apoio dos principais políticos aliados, caso do ex-ministro da
Casa Civil Ciro Nogueira, presidente do PP, e dos presidentes do Senado e da
Câmara, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL). A maioria dos
integrantes do Alto Comando do Exército também não aderiu ao golpe. Além disso,
o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, reconheceu de pronto a eleição do
presidente Lula; ou seja, não havia articulação internacional.
Quebras de sigilos telemático, telefônico, bancário e
fiscal, colaboração premiada, buscas e apreensões, entre outras medidas
devidamente autorizadas pelo Poder Judiciário, possibilitaram a montagem do
quebra-cabeças. Seis grupos foram identificados na conspiração: o de
desinformação e ataques ao sistema eleitoral; o responsável por incitar
militares a aderirem ao golpe de Estado; o jurídico; o operacional de apoio às
ações golpistas; o de inteligência paralela; e o núcleo operacional para
cumprimento de medidas coercitivas.
Omissões esclarecidas
Mais 27 pessoas, a maioria militares, foram indiciadas:
Ailton Gonçalves Moraes Barros; Alexandre Castilho Bitencourt da Silva; Amauri
Feres Saad; Anderson Lima de Moura; Ângelo Martins Denicoli; Bernardo Romão
Correa Netto; Carlos Cesar Moretzsohn Rocha; Carlos Giovani Delevati Pasini;
Cleverson Ney Magalhães; Fabricio Moreira de Bastos; Fernando Cerimedo; Filipe
Garcia Martins; Giancarlo Gomes Rodrigues; Guilherme Marques de Almeida; Hélio
Ferreira Lima; José Eduardo de Oliveira e Silva; Laercio Vergílio; Marcelo
Bormevet; Marcelo Costa Câmara; Mario Fernandes; Nilton Diniz Rodrigues; Paulo
Renato de Oliveira Figueiredo Filho; Rafael Martins de Oliveira; Ronald
Ferreira de Araujo Júnior; Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros; Tércio Arnaud
Tomaz e Wladimir Matos Soares.
O trabalho da PF não foi encerrado, há novas revelações por
parte dos denunciados. Um deles, o tenente-coronel Mauro Cid, prestou
depoimento, ontem à tarde, ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
responsável pelo inquérito, Alexandre de Moraes, porque havia omitido
informações que mais tarde foram recuperadas de seu celular pela PF. Ao
contrário das expectativas, Mauro Cid conseguiu manter a delação premiada.
Após três horas de audiência, o ministro Alexandre de Moraes
confirmou a validade do acordo de colaboração com a Justiça. O ministro
considerou que o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro esclareceu as omissões e
contradições apontadas pela Polícia Federal. Assim, as informações apresentadas
pelo militar seguem sob apuração.
Entre o indiciamento e a condenação de Bolsonaro e
integrantes da cúpula do governo passado, há um longo caminho a ser percorrido.
Agora, o ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, deve enviar o material
para análise da Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem cabe oferecer a
denúncia contra os envolvidos. Somente se — e quando — a denúncia for acolhida
pelo STF é que Bolsonaro e seus auxiliares se tornarão réus.
Desde já, há uma batalha política em curso, com uma guerra
de narrativas nas redes sociais, nas quais os partidários do ex-presidente Jair
Bolsonaro afirmam que tudo não passa de uma armação política para beneficiar o
governo Lula. Há dois questionamentos: um quanto à veracidade das mensagens
recuperadas no celular de Mauro Cid; outro, sobre a legitimidade de Moraes ser
o relator do caso, se ele é um dos alvos da suposta tentativa de assassinato
revelada no relatório da PF.
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