Ninguém discute a necessidade de equilibrar contas, a
questão é definir quem vai perder
O mercado não gostou do pacote de corte de gastos do
governo. Assim que o ministro Fernando Haddad terminou o anúncio na TV, as
queixas começaram a pipocar no noticiário online.
“Foi mais do mesmo”, esbravejou um analista de
investimentos. “Muito inadequado”, reprovou o chefe de uma consultoria. “Gerou
frustração”, sentenciou o porta-voz de uma corretora.
O azedume se refletiu ontem nos indicadores econômicos. A
Bolsa caiu 1,73%. O dólar chegou a ultrapassar os R$ 6. Questionado sobre as
reações negativas, o ministro Fernando Haddad disse que o mercado tem errado
nas previsões. “É preciso colocar em xeque as profecias não realizadas”,
ironizou.
Ninguém discute a necessidade de equilibrar
as contas para estabilizar a trajetória da dívida pública. A questão é decidir
onde cortar — e quais setores serão poupados da tesoura.
O pacote prevê mudar a Previdência dos militares, acabar com
os supersalários na administração pública e limitar o crescimento das emendas
parlamentares. As medidas mexem com interesses de corporações fardadas e
engravatadas. Por isso mesmo, arriscam cair no Congresso, como ocorreu com a
tentativa de reduzir isenções fiscais.
O governo ainda promete endurecer regras para combater
fraudes e desperdícios no Bolsa Família e no BPC. Tudo somado, projeta uma
economia de R$ 70 bilhões em dois anos. O mercado achou pouco, mas cabe
perguntar o que seria suficiente para saciá-lo.
Na quarta-feira, três deputados apresentaram um pacote
alternativo, mais alinhado aos desejos da ortodoxia liberal. O texto prevê
acabar com os pisos da saúde e da educação e desvincular o salário mínimo das
aposentadorias e do BPC. Em português claro, isso significaria empurrar a conta
do ajuste para os mais pobres.
O governo derrapou ao misturar os cortes com o anúncio da
isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, algo prometido e
repetido desde a campanha. A intenção era adoçar o arrocho com uma medida
popular, mas o efeito foi elevar o tom das críticas à Fazenda.
Isso não significa dizer que Lula errou por não se curvar ao
programa da Faria Lima. Com ou sem pacote, a elite econômica apoiará qualquer
candidato com chance de derrotá-lo em 2026.
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