Se apuração chegar a julgamento, futuro político do
ex-presidente estará em risco
A dupla hélice que entrelaça as histórias políticas de Jair
Bolsonaro e Donald Trump,
os próceres do populismo de direita nas Américas, é marcada por um ritmo no
qual fatos em torno do americano sempre se
repetiam dois anos depois, respeitando o ciclo eleitoral de cada país.
Foi assim na ascensão e na queda de ambos, e também na explosão
golpista que sucedeu suas debacles nas urnas, seja o 6 de janeiro de
2021 no Capitólio ou o 8 de janeiro de 2023, na praça dos Três Poderes.
Com isso, um bolsonarista desavisado pode dizer que o
indiciamento do ex-presidente nesta quinta (21) antecede uma volta por cima,
como ocorreu com o americano, que chegou a ser condenado num caso de fraude
fiscal neste ano antes de ser colocado novamente na Casa Branca.
À boca miúda, ele pode até torcer por uma
repetição do roteiro vivido por Lula (PT). O então
ex-presidente ficou 580 dias preso a partir de abril de 2018 só para ver
uma sucessão
de decisões judiciais primeiro o libertar, depois suspender sua
condenação, abrindo o caminho para derrotar
Bolsonaro em 2022.
Mas há diferenças importantes em todos os casos. Primeiro, a
construção do caso pela Polícia Federal, que reuniu elementos para montar a
pirâmide golpista de baixo para cima, deixando o chefe apontado da intentona
para o fim.
Se alguma peça é frágil e fará desmoronar tudo, é algo que
compete à Procuradoria-Geral da República avaliar e, se o processo for tocado
em frente, à Justiça. Mas a cadeia de comando do que se pretendia, explicitada
até em reunião gravada em vídeo no Planalto, parece
bastante clara. O futuro de Bolsonaro está em risco.
Voltando a Trump, o sistema político americano é muito
diverso do brasileiro, até porque lá não há nada parecido com Lei da Ficha
Limpa. O republicano poderia governar até da cadeia, caso tivesse sido preso a
tempo. Agora, ungido presidente de novo, deve ver seus rolos judiciais
desaparecerem.
Além do mais, as ligações de Trump com a intentona do 6 de
Janeiro são evidentemente fortes, mas não se tem notícia de uma trama tão
detalhada como a do Brasil, país
onde golpista faz minuta.
Já acerca de Lula, há a questão do momento. O petista foi
beneficiado pelo clima de revisão geral da Operação
Lava Jato, que sempre teve adversários poderosos no Supremo.
Os abusos da turma de Sergio Moro tornaram-se
evidentes, ainda que a alegação de inexistência de crimes cai por terra quando
se vê os bilhões que a Petrobras recebeu de volta em acordos.
Bolsonaro, por sua vez, vinha tentando recriar o clima de
virada de mesa, com seus aliados trabalhando por uma anistia no Congresso que,
nominalmente favorecendo os réus e condenados do 8 de Janeiro, ao fim livrasse
o ex-presidente também.
Não há clima para tal após uma pessoa se explodir na frente
do Supremo alegando querer matar Alexandre
de Moraes e, agora, com a descoberta de que o plano dos golpistas
incluía até a tentativa de assassinato de Lula, do vice Geraldo Alckmin e do
magistrado.
Como estamos no Brasil, país do famoso passado incerto, tudo
pode sempre mudar. Isso dito, é previsível que Bolsonaro, a exemplo de Trump e
de Lula, se agarre ao processo como forma de manter-se em evidência e denunciar
suposta perseguição.
Nisso, pode ser bem-sucedido para os seus, mas o cenário
geral não o favorece. Não por acaso, os candidatos a sucedê-lo no campo da
direita, Tarcísio
de Freitas (Republicanos-SP) à frente, já estão no aquecimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário