Foram dias duros, mas o governo encerra a semana
contabilizando vitórias como a aprovação do pacote fiscal e da Reforma
Tributária
A semana passada foi especialmente tumultuada, mas terminou
com balanço positivo. Foi aprovada a última parte da regulamentação da Reforma
Tributária, dos impostos sobre consumo, uma vitória em uma luta de mais de
três décadas. Foi aprovado o pacote fiscal. O dólar disparou, bateu em nível
recorde, mas recuou na tarde da quinta e na sexta-feira. Houve uma transição
harmônica no Banco
Central e o presidente Lula deu
uma chancela firme à autonomia do BC.
Ninguém sai de guerras sem baixas e feridos. O pacote perdeu
parte da consistência, o Congresso se rendeu ao lobby da minoria do
funcionalismo que ganha acima do teto. A Reforma Tributária passou a abrigar
concessões a vários grupos de interesse. O mais danoso deles, o das armas. O
dólar permaneceu alto e isso afeta a economia real, principalmente a inflação.
O projeto de fundir os impostos sobre
consumo e criar um imposto de valor agregado esteve nos planos de vários
governos, inclusive do próprio Lula, e todos fracassaram. Essa específica
proposta nasceu no legislativo, numa PEC apresentada pelo deputado Baleia Rossi em
2019 e foi ignorada pelo governo Bolsonaro. O ministro Fernando
Haddad assumiu o projeto como sendo do governo, trouxe para a sua
equipe o inspirador da ideia, o economista Bernard Appy, e negociou
incansavelmente. É uma vitória histórica. O Brasil inicia agora a transição,
ainda que lenta, para uma forma mais moderna de tributação sobre o consumo.
A atual estrutura tributária foi elaborada na ditadura que,
por natureza, não negocia e impõe suas propostas. Esta foi feita na democracia,
com um Congresso forte, dominado por muitos lobbies e com uma oposição sem
compromisso com as ideias que diz defender na economia. Foi um grande feito
sim. Agora é saber como lidar com todos os defeitos e incompletudes da reforma.
Não houve coragem de mexer na Zona Franca de Manaus e, em alguns aspectos,
ampliou suas vantagens. O que é preciso fazer é levar o polo industrial cada
vez mais para a economia da sustentabilidade.
O Congresso cedeu a lobbies de diversas categorias
profissionais, ao todo 18 profissões pagarão menos impostos. Isso sem falar nos
médicos que entram no desconto maior da saúde. Vários lobbies setoriais
venceram. O pior foi a vitória da bancada da bala que conseguiu muito mais do
que imaginava. As armas e munições não pagarão imposto seletivo, numa derrota
do governo que em todos os momentos tentou defender o racional nesse caso. Mas
o desastre é ainda maior, porque as armas no futuro pagarão menos impostos do
que pagam hoje. Para evitar esse tiro pela culatra, é preciso encontrar uma
saída, em algum momento. Subsidiar o comércio de armas é tudo de que o Brasil
não precisa.
As medidas de ajuste fiscal propostas pelos ministérios da
Fazenda e do Planejamento eram boas, apesar do que sustenta o mercado
financeiro. Poderia ter ousado, feito mais, sem dúvida. Porém, uma coisa é
elaborar uma proposta de prancheta, ideal, como se a sociedade, as forças
políticas e os grupos de interesse não existissem. Outra bem diferente é ter
que negociar internamente no governo e depois atravessar o deserto parlamentar
com essas propostas. O Congresso aprovou a mudança do salário mínimo, indicando
uma redução no ritmo de crescimento de toda a despesa previdenciária e
assistencial, que era a parte central do pacote. Aprovou também a transição no
abono que resultará em maior focalização. O mercado fez as contas e reclamou:
vai levar sete anos e isso demora muito tempo. Poderia ter pensado numa fórmula
para resolver a contradição do seguro-desemprego, que sobe nos bons momentos.
Não mexeu no mínimo constitucional de saúde, como muitos economistas propunham.
Perguntei ao economista Armínio Fraga se o governo poderia fazer essa mudança e
ele respondeu que seria “um crime” reduzir o gasto com a saúde. Vejam só como o
assunto é controverso.
O câmbio ficou selvagem durante a semana. Houve de tudo,
inclusive especulação com fake news, e piora do cenário internacional. Bateu em
R$ 6,30. E cedeu a golpes de tacape. Nunca se viu uma venda de dólar neste
volume. O pior da alta do dólar é que seu efeito atinge os preços em geral. Um
dos bons motivos da queda do câmbio foi ver a transição harmoniosa no Banco
Central. Ainda que confirmando a política contracionista com a qual entraremos
no ano que vem. No fim, foi uma semana dura, mas com vitória.
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