O prefeito do Rio atua contra o cartel dos transportes
públicos da cidade
O ano começou com uma grande notícia. O prefeito do
Rio, Eduardo
Paes, atacou o cartel dos transportes públicos da cidade:
— Estamos enfrentando uma turma que é uma máfia. (...)
Mafiosos que fazem essa caixa-preta há muito tempo no Rio. Eles não vão nos
deter. Vamos dar transparência a esse sistema e pagar um preço justo.
Na raiz da zanga do prefeito está sua tentativa de
integração dos transportes com um novo sistema de bilhetagem. No quarto
mandato, Paes conhece de cor e salteado as operações do que agora, felizmente,
chama de máfia.
Revisitar as proezas desse cartel é um passeio pela ruína da
política e dos serviços públicos da cidade.
Em 2004, a prefeita Marta Suplicy instituiu o Bilhete Único
em São Paulo. Incomodou as empresas e os transportes que defendiam seus
interesses. No Rio, fez-se de conta que a inovação era coisa de outra galáxia.
Só em 2007 a Fetranspor, alma do cartel, criou um pastel de vento chamado
RioCard Expresso, sem desconto.
O Rio só instituiu o Bilhete Único em 2010. Custava mais
caro que o de São Paulo e tinha serventia menor. A Assembleia Legislativa criou
uma CPI para abrir a caixa-preta da Fetranspor. Acabou em CPIzza.
Governadores, prefeitos e transportecas
empulhavam a população com BRTs e promessas, enquanto tudo continuava na mesma
nos domínios do cartel.
Em 2017, a Polícia Federal entrou no circuito e prendeu um
pedaço daquilo que Eduardo Paes agora chama de máfia. Foram presos o empresário
Jacob Barata Filho, o Rei dos Ônibus, e seu grão-vizir, Lélis Marcos Teixeira,
presidente da Fetranspor. Disso resultou a exposição de uma rede de propinas
que ia dos gabinetes dos governadores Luiz Fernando Pezão e Sérgio Cabral à
Assembleia, passando pela Secretaria do Transportes e pelo Tribunal de Contas.
O Magnífico Cabral teria recebido R$ 144,7 milhões da Fetranspor entre 2010 e
2016. A investigação alcançou Rodrigo Bethlem, ex-secretário Especial da Ordem
Pública do prefeito Eduardo Paes.
Vale lembrar um trecho do relatório do Ministério Público,
de novembro de 2017, referindo-se a Jorge Picciani e Paulo Melo, ex-presidentes
da Assembleia:
“Essas planilhas dizem para nós que, no período de 15 de
julho de 2010 a 14 de julho de 2015, foram pagos da conta da Fetranspor para
Picciani R$ 58,6 milhões, e para Paulo Melo R$ 54,3 milhões. Desse dinheiro,
parte foi paga a mando de Sérgio Cabral.”
O dinheiro das empresas de ônibus tem uma virtude rara, pois
não deixa rastro. O cidadão paga sua passagem, a empresa recolhe, ensaca as
notas e as remete ao amigo. Tudo longe do faro do Coaf ou do Banco Central.
Todas essas acusações poderiam ser coisa de jornalistas
irresponsáveis, procuradores vingativos ou políticos malvados, até que em 2019,
o doutor Lélis Teixeira resolveu falar.
Os repórteres Aguirre Talento e Luiz Ernesto Magalhães
revelaram que, com a autoridade de ex-presidente da Fetranspor, Lélis prestou
uma colaboração que rendeu 25 anexos. Detonou empresários, políticos,
servidores e magistrados. Pela sua conta, em dez anos o cartel aspergiu R$ 120
milhões para pelo menos 30 afortunadas autoridades. Secretários recebiam
mesadas de até R$ 200 mil.
Segundo Lélis, a Fetranspor investiu R$ 40 milhões na
campanha de 2012 de Eduardo Paes. Ele respondeu afirmando que todas as suas
contas de campanha foram aprovadas pela Justiça Eleitoral e lamentava ter que
responder a acusações sem conhecer seu teor.
Uma superauditoria para os transportes
Um novo sistema de bilhetagem para os transportes do Rio
pode encerrar décadas de domínio daquilo que o prefeito Eduardo Paes chamou de
máfia. Pelo sistema atual, as empresas de ônibus recebem subsídios públicos a
partir de vagos relatórios de transporte de passageiros. Há décadas esse
sistema é conhecido como “caixa-preta”.
Comprovadamente, a Fetranspor foi uma usina de jababaculês.
A leitura do que se sabe desanima.
O jornalista Franklin Martins pôs na rede o lundu “Estamos
no século das luzes”, de 1857, quando se cantava no Rio:
“Os transportes são imensos / Quer por terra, quer por mar /
(...) Hoje tudo são progressos / Da famosa padroeira”.
Nascida em 1955, a Fetranspor resistiu a governadores,
prefeitos (inclusive três mandatos de Eduardo Paes), CPIzzas, decisões
judiciais e inúmeras operações policiais. O resultado desse domínio pode ser
avaliado todos os dias nas ruas do Rio.
A Fetranspor é um dos cumes de um sistema corrupto, mas não
é sua base. A adoção de um novo sistema de bilhetagem depende de muitos
fatores, inclusive uma articulação com o governo do Estado, onde está o
doutor Cláudio
Castro.
O Rio de Janeiro vive uma situação semelhante à de Nova York
no final do século XIX. Lá, empresários e juízes se articularam contra a famosa
ladroeira e conseguiram alguns resultados.
Conhecido o passado, o prefeito Eduardo Paes poderia nomear
uma comissão composta por empresários e engenheiros sem vínculo com o governo,
para avaliar os contratos de transportes públicos do Rio. Ela examinaria os
acertos vigentes e os já assinados, bem como as planilhas do Riocard, voraz
filhote da Fetranspor. A comissão poderia ser presidida por um ex-ministro (ou
ministra) do Supremo Tribunal.
Em poucas semanas essa comissão fecharia os buracos por onde
a máfia se enfiou e também aqueles por onde poderá voltar a se enfiar.
Galeão
Houve dias em que os passageiros de voos internacionais do
aeroporto do Galeão ralaram mais de uma hora nas filas do check-in e da
verificação de passaportes.
São muitos os aeroportos onde rala-se no desembarque. Ralar
para embarcar é jabuticaba.
Os advogados do bolsonarismo
Jair
Bolsonaro resolveu passar a coordenação de sua defesa para o
criminalista Celso Vilardi. Para quem já teve como advogado o expansivo
Frederick Wassef, foi um grande passo.
Bolsonaro seguiu o exemplo do general da reserva Walter
Braga Netto, que contratou o advogado José Luis de Oliveira Lima, defensor do
ex-ministro José Dirceu.
Bolsonaro e Braga Netto perceberam a gravidade de suas
situações e foram atrás de profissionais.
Braga Netto é uma pessoa contida. Bolsonaro é explosivo e
mandão.
Para ele, ouvir Vilardi será um exercício inédito de
disciplina.
COP 30 sem calado
O governo federal e o do Pará desistiram do projeto de
dragagem do porto de Belém. Se a obra fosse adiante, grandes navios poderiam
atracar nele, hospedando parte das 40 mil pessoas esperadas para a COP 30.
Belém não tem rede hoteleira para tamanha demanda.
Sem a dragagem do porto, transatlânticos poderão atracar no
terminal hidroviário de Outeiro, a 35 quilômetros da cidade. Ele está em obras.
Para as pessoas que irão a Belém, faltam 11 meses para a
abertura da COP 30.
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