terça-feira, 14 de janeiro de 2025

GOVERNO NÃO DEVE DEIXAR BC SOZINHO CONTRA A INFLAÇÃO

Editorial O Globo

Ano mal começou, e Brasil corre sério risco de repetir em 2025 alta de preços acima de 4,5%, o teto da meta

Em declaração sobre as perspectivas da economia global em 2025, a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, reconheceu o alto grau de imprevisibilidade deste ano devido às dúvidas a respeito das políticas a serem adotadas pelo novo governo dos Estados Unidos. Entre as certezas está a pressão inflacionária no Brasil. Tal cenário deveria ligar todas as sirenes no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e no Congresso. A política fiscal irresponsável eleva as incertezas sobre a trajetória da dívida pública, faz o câmbio disparar e alimenta a alta de preços. Se o Banco Central (BC) continuar solitário no combate à inflação, a tarefa será mais difícil e a situação mais dolorosa para a população.

O índice oficial, o IPCA, está elevado, e a perspectiva é que siga assim. Desde outubro, o acumulado de 12 meses tem ficado acima do teto da meta estipulada para o BC (4,50%). Foi dessa forma que a economia fechou o ano de 2024. Olhando para a frente, os cenários não indicam melhora. O mais grave é a aparente perda de força da política monetária. É certo que o impacto de mudanças na taxa básica de juros, a Selic, não acontece de uma hora para outra. O aperto leva meses para se transmitir pela economia e ser sentido na estabilização dos preços. Mas é esperado que o anúncio de altas acentuadas tenha efeito rápido nas previsões. Não é o que tem ocorrido. Em dezembro, o BC elevou a Selic em 1 ponto percentual, para 12,25% ao ano, e ficou o aviso de poder chegar a 14,25% até março. Antes do anúncio, a estimativa de economistas era de um IPCA de 4,59% em 2025. No levantamento desta segunda-feira, o percentual estava em 5%.

É possível que o BC, agora sob a presidência de Gabriel Galípolo, consiga, mais adiante, ancorar as expectativas. Mas o governo deveria prestar mais atenção nas dúvidas que alimentam as previsões pessimistas. Uma delas é como reagirá o presidente Lula quando a economia começar a desacelerar devido ao choque dos juros. O histórico não é nada bom. Mesmo antes de assumir, a estratégia foi a expansão do gasto para fazer a roda da economia girar mais rapidamente. Não faltaram estímulos para manter a atividade em alta, apesar de consequências nefastas, como o aumento da dívida pública, do dólar e da inflação. Caso esteja mesmo convencido de que a economia está sobreaquecida e é preciso desacelerar, o presidente terá de fazer mais que promessas. Em entrevista ao GLOBO, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, indicou a adoção de novas medidas fiscais em 2025. Uma repetição do que aconteceu no fim do ano passado pouco ou nada deve ajudar. Em novembro, o governo enviou ao Congresso um pacote fiscal com cortes tímidos, e, em seguida, os deputados e senadores conseguiram a proeza de piorar o que já era ruim.

Na carta enviada ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para justificar o fechamento de 2024 com o IPCA estourando o teto, Galípolo afirma que o cenário de referência indica uma inflação acima do limite máximo até o terceiro trimestre. Portanto é grande o risco de mais um ano fora do intervalo de tolerância. Em 2025, uma nova metodologia será adotada. Se a inflação ficar fora do teto por seis meses consecutivos, é considerado descumprimento da meta. Para a população, a possibilidade de alta de preços por mais tempo num mundo mais imprevisível é um início de ano preocupante.

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