terça-feira, 14 de janeiro de 2025

SEGURANÇA DIGITAL DEFICIENTE EXPÕE DADOS DA POPULAÇÃO A HACKERS

Editorial O Globo

Uma auditoria do TCU considera ‘alarmante’ o perigo de vazamento de informações em 229 órgãos federais

É espantosa a vulnerabilidade constatada na proteção de informações sensíveis da população ou do próprio Estado. Invasões dos criminosos digitais costumam ser mantidas em sigilo, para não expor os pontos frágeis da máquina administrativa, mas uma auditoria recente do Tribunal de Contas da União (TCU) revela a dimensão da ameaça. A vulnerabilidade prejudica a população. No ano passado, houve vazamento de informações do Conect SUS. O furto de senhas de servidores públicos permitiu o desvio de cerca de R$ 15 milhões do sistema de pagamentos do governo federal, o Siafi (apenas R$ 2 milhões foram recuperados). Também houve desvios no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

De acordo com o TCU, estão em alta os “incidentes cibernéticos” — termo vago que inclui furto de dados, tentativa de obter senhas (phishing) e ataques de vírus. No primeiro semestre do ano passado, os casos já haviam superado os 4.300 ocorridos em 2023. Chegaram a 8.692 no final de 2024. O diagnóstico do TCU, depois de auditorias feitas nos dois últimos anos, é que o risco de vazamento de dados em 229 órgãos públicos federais é “particularmente alarmante”.

Dos 229 órgãos federais auditados pelo TCU, apenas 14 haviam adotado mais de 70% das medidas de segurança recomendadas, e 25 nem sequer responderam ao questionário. Nenhum atingiu o nível mais alto na escala de avaliação. Apenas 6% ficaram no patamar “em aprimoramento”, o segundo mais elevado. É assustador que 42% não contassem sequer com programas antivírus para proteger seus computadores e que só 8% criptografassem dados sensíveis. “Se continuar assim, os riscos aumentarão, principalmente com a evolução da inteligência artificial, que pode ser desenvolvida para quebrar códigos”, diz o advogado Renato Opice Brum, professor de Direito Digital da FAAP, em São Paulo.

Em 2023, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos criou o Programa de Privacidade e Segurança da Informação. O TCU constatou que ele não vem sendo seguido. O Brasil tem subido em rankings regionais e globais de cibersegurança, mas apenas porque passou por avanço regulatório, segundo Luca Belli, coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio. “A prática é muito distante da teoria da lei.”

O governo federal pode até formular programas adequados, mas derrapa na execução. Como não há cultura de cobrança no serviço público, informações sensíveis ficam desprotegidas em bancos de dados do Estado. Consta do relatório do TCU o diagnóstico de que a origem do problema está na ausência de normas que prevejam a punição da alta administração pelas falhas constatadas. Sem uma política de segurança de dados eficiente, com atualizações constantes, o Estado brasileiro manterá a população sob risco.

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