sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

JURO E DÓLAR AFETAM AVANÇO DO SETOR PRIVADO NA INFRAESTRUTURA

Editorial Valor Econômico

Apesar de pequenos progressos nos investimentos, que representam 2,2% do PIB em 2024, o país está longe dos 4,3% considerados ideais para modernizar a infraestrutura em 30 anos

O governo conta com investimento em infraestrutura para estimular a economia em 2025 e busca estimular o setor privado, na ausência de espaço fiscal no orçamento. A estratégia foi relativamente bem-sucedida em 2024, com o avanço nas modelagens das concessões, especialmente das rodovias, atraindo novos players inclusive estrangeiros, e da legislação, como a Lei do Saneamento que, apesar das revisões feitas sob pressão política, melhorou o quadro institucional. O cenário macroeconômico, no entanto, com a elevação dos juros e a alta do câmbio, pode prejudicar os planos.

O investimento em infraestrutura fechou 2024 com crescimento de 15%, atingindo R$ 259,3 bilhões, segundo a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), que inclui transportes, especialmente rodovias, saneamento, energia e telecomunicações. Desse total, 76% vieram do setor privado, e o restante veio de fontes públicas, federais, estaduais e municipais. O valor é recorde, superando em 8% a marca anterior, de 2014, corrigida a valores atuais. Há estimativas menores, ainda assim vistosas, como o da consultoria Inter.B, que avalia em R$ 212,7 bilhões os investimentos em infraestrutura de 2024, alta de 10%.

Projetos de energia elétrica absorveram quase metade dos recursos (46%) concentrados nos leilões de transmissão. Na outra ponta, com 16,6% do total, está a telecomunicação, setor mais maduro e, por isso, com menos investimentos depois da corrida pela implantação do 5G. Mas as áreas que despertam mais atenção são as de rodovias e de saneamento.

Os investimentos em transportes e logística alcançaram R$ 63 bilhões em 2024, ou 24% do total, com crescimento de 52,2 % em relação a 2023. Foram realizadas nove concessões de rodovias e feitos 18 leilões de terminais portuários na primeira metade do governo Lula. A expansão está sendo possível graças ao interesse de novos operadores estrangeiros, o que não ocorria desde 2007, e do setor financeiro, atraídos por modelagens mais atraentes e pelo trabalho do governo de flexibilização das regras, em contato com interessados, inclusive no exterior.

Em agosto, o governo conseguiu destravar a concessão da chamada “rodovia da morte”, em Minas Gerais, após três tentativas frustradas, que começaram em 2021. A concessão foi arrematada pela estreante 4UM, que competiu com o Opportunity, outro novato no setor. Em setembro, o grupo francês Vinci ganhou a concessão da Rota dos Cristais, de Cristalina (GO) a Belo Horizonte (MG), superando os lances da CCR, da gestora 4UM em consórcio com o Opportunity e do banco BTG Pactual. Na área de saneamento, os investimentos dobraram para R$ 34 bilhões em 2024, com crescimento de 26,9%, excluindo a privatização da Sabesp. No setor, o principal impulsionador é o marco legal do saneamento, aprovado em 2020. Desde então, os municípios com operadores privados no saneamento aumentaram de 5% para 30%.

Os planos futuros são ambiciosos. Os principais leilões de saneamento esperados são as concessões dos Estados de Pará, Pernambuco e Rondônia. Mas há 34 projetos sendo modelados pelo BNDES, e 24 podem sair do forno em 2025, com uma demanda de R$ 74,6 bilhões em investimentos.

Na área de transportes, o governo tem que correr uma vez que prometeu realizar 35 concessões de estradas até 2026, e fez apenas nove até agora. Em 2015, devem ser feitos 15 leilões, começando já em 7 de janeiro com a concessão da Ponte Internacional de São Borja, que liga a cidade gaúcha a Santo Tomé, na Argentina. Há ainda a promessa de realizar 55 leilões portuários até 2026. Em aeroportos, o governo pretende leiloar nada menos que 51 regionais localizados em cidades da Amazônia Legal e da região Nordeste, e mais 50 em 2026, com investimento total previsto de R$ 7,3 bilhões. Sem falar na área ferroviária, na qual pode haver avanço após recente acordo com a Vale, com que discute a renovação de trechos onde já atua, a Estrada de Ferro Carajás e a Ferrovia Vitória-Minas.

Com tantos projetos no pipeline é óbvia a necessidade de recorrer ao capital privado para avançar na construção e modernização da infraestrutura do País. Nem o Novo PAC consegue o R$ 1,7 trilhão de recursos necessários do governo.

A ampliação das concessões tem sido uma estratégia crucial diante da limitação do espaço fiscal para investimentos públicos, mas o cenário de juros elevados, alta inflacionária e instabilidade cambial ameaça a atratividade dos projetos. Esses fatores impactam as taxas de retorno, tornando mais difícil atrair investidores de longo prazo. Além disso, problemas estruturais, como insegurança jurídica e fragilidade regulatória em alguns setores agravam os riscos associados aos contratos, desestimulando o setor privado.

Mesmo com avanços, como a Lei de Debêntures de Infraestrutura e o fortalecimento do BNDES como fornecedor de recursos, a alocação de recursos ainda está aquém dos níveis necessários para atender à demanda nacional. Apesar de pequenos progressos nos investimentos, que representam 2,2% do PIB em 2024, o país está longe dos 4,3% considerados ideais para modernizar a infraestrutura em 30 anos, evidenciando a necessidade de políticas consistentes e de um ambiente regulatório estável para viabilizar essa transição.

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