Falta coragem ao governo e Congresso para encarar os
problemas do benefício. Isso só agrava a situação
Integrantes do governo começaram o ano falando sobre a
necessidade de adoção de novas medidas fiscais. Fariam bem se voltassem a
examinar o Benefício de Prestação Continuada (BPC), um salário mínimo pago a
idosos e deficientes de baixa renda, mesmo que não tenham contribuído para a
Previdência. O programa perdeu o foco e hoje também atende a um público que não
se enquadra no perfil pensado inicialmente. Devido a uma visão populista
compartilhada pelo governo, Congresso e Judiciário — que costuma conceder o benefício
a quem bate às suas portas — , a conta não para de subir.
Pelos cálculos do ex-presidente do INSS Leonardo
Rolim, o Tesouro gasta por ano R$ 14,5 bilhões com pagamentos indevidos de BPC,
o que representará 12% do que deverá ser destinado ao benefício neste ano. Nas
suas estimativas, Rolim se baseia no histórico de concessões verificado entre
2011 e 2024, que mostra um forte aumento no número de beneficiários, numa
elevação fora dos padrões demográficos de envelhecimento e pessoas deficientes
de baixa renda.
Apenas entre junho de 2021 e outubro de 2024, o total de
benefícios pagos passou de 4,71 milhões para 6,3 milhões, um aumento de 33%. Os
números chamaram a atenção da equipe econômica, e mudanças na gestão do BPC
foram incluídas no pacote fiscal do ano passado. Houve, então, resistências no
Congresso e do presidente Lula. No final, a estimativa de uma economia de R$ 2
bilhões caiu pela metade.
Da proposta original do Ministério da Fazenda constava a
inclusão na legislação da distinção clara entre deficiência “moderada” e
“grave” para efeito da concessão do benefício. No entender de Rolim, isso
poderia reduzir a concessão do BPC pela Justiça, responsável por um terço do
total de benefícios. Quanto mais clara e objetiva a legislação, menor o espaço
para disputas judiciais. Também daria base jurídica ao Ministério do
Desenvolvimento Social para negar o BPC a portadores de deficiências “leves”, uma
das principais causas do aumento no número de benefícios nos últimos anos. Este
ponto contou com apoio na Câmara dos Deputados, mas foi vetado por Lula,
supostamente para facilitar a aprovação do pacote pelo Senado.
Os juízes continuarão tendo grande influência na gestão do
BPC. Paulo Tafner, economista especializado em Previdência, considera que o
veto de Lula “foi um ato de irresponsabilidade”. Na prática, demonstrou que não
está preocupado com o equilíbrio das contas públicas. Já ao Congresso deve ser
creditada a retirada do projeto original da obrigatoriedade, na análise do
pedido do benefício, da inclusão da renda de cônjuge ou companheiro que não
reside no mesmo imóvel.
Perdeu-se no ano passado uma oportunidade de reformar um
programa social importante para deficientes e idosos de baixa renda. O
crescimento contínuo dos gastos com o BPC prejudica quem mais necessita do
benefício. Cedo ou tarde, por causa desses desvios, o programa poderá ficar
insustentável. Pela importância, o assunto deveria voltar à pauta neste ano.
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