Vitórias com as de Trump e Putin elevam percepção de
avanço do autoritarismo, mas liberdade política ainda mostra força
Mais de 70 países, nos quais reside a metade da população do
planeta, realizaram pleitos nacionais para definir o poder central em 2024. O
simples fato de haver tanta gente indo às urnas sinaliza, parafraseando Mark
Twain, que os rumores sobre o ocaso da democracia são exagerados.
A título de comparação, em 1970, pelos critérios do V-Dem,
53% das nações do globo eram autocracias fechadas (ditaduras plenas). As
democracias liberais e democracias eleitorais não passavam de 24%. Já em 2023,
apenas 19% dos países eram autocracias fechadas, e as democracias liberais ou
eleitorais somavam 51%.
Reconhecer o enorme avanço não implica fechar os olhos para
ameaças, que existem e vivem um período de alta. A sensação que se tem ao
analisar os resultados dos pleitos de 2024 é a de que o autoritarismo avançou.
O principal motivo dessa percepção é a sólida vitória
de Donald
Trump. Dos anos 90 até a primeira década deste século, os EUA foram o país
que mais propugnou pela expansão da democracia em escala global. É preocupante
vê-los sob a liderança de um
presidente que não tem o menor compromisso com a democracia, nem interna
nem externamente, e desconfia-se mesmo de que poderá voltar a golpeá-la, como
fez em janeiro de 2021.
Outras vitórias que contribuem para a percepção negativa
foram as de Vladimir
Putin na Rússia e a
de Nayib
Bukele em El Salvador,
que vai ganhando imitadores no continente. A Venezuela poderia
entrar nessa lista, mas nesse
caso de eleição fraudada não se pode responsabilizar o eleitor.
Na Europa ocidental,
a extrema direita obtém avanços importantes, mas não venceu o principal pleito
que disputou —as legislativas antecipadas na França.
Em muitas situações, há nuances a considerar. Na Índia, por
exemplo, o líder com tendências autoritárias, Narendra Modi, conseguiu
obter seu terceiro mandato consecutivo, mas viu sua maioria emagrecer. Terá
agora de fazer um governo de coalizão. O autoritarismo avançou (novo mandato)
ou recuou (maioria mais magra)?
A situação perder para a oposição, com alternância entre
grupos mais à esquerda e mais à direita, é a essência da democracia. Há motivo
para preocupação só quando vitoriosos ou derrotados passam a atuar
explicitamente contra as instituições ou tentam moldá-las para atender a seus
interesses particulares.
Isso tem acontecido com mais frequência. Contudo, ao fim e
ao cabo, não foram tantas as nações que deixaram de ser democracias nos últimos
anos.
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