quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

SURTO DE GRIPE AVIÁRIA NOS ESTADOS UNIDOS NÃO É MOTIVO PARA DESESPERO

Editorial O Globo

Infecções pelo H5N1 têm sido brandas, não há registro de contágio humano, e vacinas estão avançadas

gripe aviária, transmitida pela variante H5N1 do vírus influenza, tem preocupado os epidemiologistas. Entre 2003 e 2023 foram registrados 878 casos no mundo. Só neste ano, os Estados Unidos já somam 66 casos em humanos, 11 mil em aves selvagens e 128,9 milhões em aves de criação. O salto do vírus para mamíferos foi constatado em março pela infecção de vacas leiteiras e, em seguida, pela contaminação de trabalhadores rurais. Há 913 rebanhos contaminados em 16 estados americanos. O governador da Califórnia, Gavin Newsom, decretou emergência para facilitar a atuação das agências governamentais.

Por enquanto, não há registro de transmissão entre humanos. O contágio pelo leite pode ser evitado pela pasteurização, mas tendências da medicina alternativa valorizam o leite cru, cuja venda é permitida nos Estados Unidos. A partir do momento em que o vírus der o salto evolutivo necessário à transmissão entre humanos, estarão dadas condições para uma pandemia.

Dos 878 casos de H5N1 registrados entre 2003 e 2023, 458 resultaram em mortes, uma letalidade elevadíssima. Quase todos os casos americanos neste ano foram leves, semelhantes a uma gripe comum, mas um caso grave detectado na Louisiana se revela preocupante. Cientistas supõem que, para infectar humanos mais facilmente, o vírus se torna menos agressivo, como aconteceu com variantes da Covid-19.

Mas, ainda que que o H5N1 cruze a barreira de espécies numa versão branda, o impacto sobre a saúde pública pode ser relevante. Os novos casos graves sugerem que haveria pressão sobre os sistemas de saúde. “Os países devem estar atentos e se preparar com plataformas de diagnóstico adequadas para fazer mapeamento de casos e, mais que tudo, como já fizeram governos europeus e os Estados Unidos, começar a montar seus estoques de vacinas”, diz o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Vigilância Genômica de Vírus.

Caso a epidemia se alastre, não há motivo para desespero. O H5N1 é conhecido, e as pesquisas sobre vacinas estão em estágio avançado. No Brasil, o Instituto Butantan desenvolveu a sua em 2023. Só espera sinal verde da Anvisa para começar testes clínicos com humanos. Os casos de contaminação nos Estados Unidos são um motivo para acelerar a tramitação desses testes.

Em abril, a Anvisa criou regras para registro e atualização de vacinas contra a gripe aviária. Os laboratórios poderão protocolar registros que depois precisarão ser apenas atualizados diante de novas variantes. Com essa aprovação, o Butantan pode adaptar a vacina para a versão do vírus que estiver circulando. “A ideia é ter pelo menos uma quantidade mínima caso o vírus comece a se disseminar”, afirma o infectologista e diretor do Butantan Esper Kallás.

Por enquanto, a situação no Brasil é tranquila. Não houve surtos entre aves silvestres no segundo semestre, diz Helena Lage, presidente da Sociedade Brasileira de Virologia. Ela própria, no entanto, afirma que num mundo globalizado tudo muda rapidamente.

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