Lula admite que mudará ministros, repetindo o que
antecessores fizeram para redistribuir poder. A novidade é que a reforma
ministerial é também uma exigência contra a ineficiência
No almoço em que reuniu seus ministros, em 20 de dezembro, o
presidente Lula da Silva admitiu o que já se avizinhava: fará mudanças no
primeiro escalão do governo. Uma inevitável reforma ministerial deve ocorrer no
início de 2025 – resta saber se ainda em janeiro ou se fatiada de acordo com as
circunstâncias políticas. Como muitas reformas promovidas por Lula e seus
antecessores, o manejo da coalizão multipartidária puxa o cordão das mudanças.
É um modo de acomodar novos aliados, redistribuir cargos e orçamentos conforme
o tamanho do apoio de cada legenda, adquirir musculatura para aprovar agendas
de interesse do Executivo, repactuar acordos conforme as eleições
recém-ocorridas e preparar a coalizão para a próxima disputa.
A reforma não fugirá à regra, mas desta vez há também outra
razão, e claramente desabonadora para Lula e sua equipe: a ineficiência. O
terceiro mandato de Lula é uma constrangedora soma de ministérios medíocres. Na
última pesquisa realizada pelo Ipec, oito de nove áreas analisadas tiveram
avaliação negativa superando a positiva, mesmo considerando áreas com evidente
impacto, como saúde, educação, economia, meio ambiente, segurança pública e
política social. Em 2023, no marco dos dez primeiros meses de governo, outra
pesquisa, do Instituto Paraná, questionou eleitores sobre que nota dariam – de
zero a dez – a ministros. Simone Tebet (Planejamento) e Camilo Santana
(Educação) obtiveram as maiores médias: modestos 5,4.
No Alvorada, Lula não hesitou em deixar recados sobre sua
insatisfação. Márcio Macêdo (Secretaria-Geral) e Nísia Trindade (Saúde) foram
citados em tom de cobrança. José Múcio Monteiro (Defesa) também, mas neste caso
por seu pedido para deixar o governo, alegando cansaço. No almoço, Paulo
Pimenta (Comunicação Social) teve a sombra do marqueteiro Sidônio Palmeira,
cuja presença chamou a atenção por não ser ministro e estar na condição de
provável substituto numa área já criticada abertamente por Lula. Ministros
responsáveis pela articulação tiveram seus serviços sistematicamente
questionados nos dois primeiros anos de mandato.
Reformas ministeriais são comuns desde a democratização.
José Sarney abriu a série entre o fim de 1985 e o início de 1986, para retirar
parte dos ministros que herdara de Tancredo Neves, morto antes de assumir a
Presidência, e parte que disputaria as eleições nos meses seguintes. Fernando
Henrique também fez a sua. Chegou a criar uma pasta para compensar o PFL, à
época o principal partido de sustentação do governo e queixoso por perder o
Ministério da Saúde. Em 2017, PP, PR e PTB davam um ultimato a Michel Temer,
ameaçando obstruir votações caso o presidente não adiantasse mudanças. “Ou muda
ou não vota mais nada aqui”, alertava o então líder da bancada do PP, Arthur
Lira, com a forma e o conteúdo típicos do Centrão. Razão similar levaria Lula a
realizar mudanças ainda nos primeiros meses de 2023, trocando Ana Moser por
André Fufuca (PP) no Esporte e indicando Silvio Costa Filho (Republicanos) para
Portos e Aeroportos.
O apetite dos partidos é um fator de instabilidade adicional
para a ineficiência, um nó a mais numa já vasta, heterogênea e disfuncional
coalizão que marca o atual mandato. Como mostrou o cientista político Carlos
Pereira no Estadão, a coalizão de Lula tem hoje 18 partidos, enquanto seus
dois governos anteriores tinham 8 e 9 partidos, respectivamente. É mais amplo
em quantidade, mais heterogêneo na ideologia e mais desproporcional na
distribuição da Esplanada dos Ministérios. O PT tem 43% das pastas (17) e apenas
13% das cadeiras na Câmara, número que traduz a histórica incapacidade petista
de dividir o poder com aliados.
Se o presidente mudará o comando de todas as áreas
reconhecidamente ineficientes, ainda é difícil saber, até porque, se essa razão
prevalecesse, no limite ele precisaria começar a reforma por si mesmo, o que
obviamente não fará. A esta altura, nominar demissionários e eventuais
substitutos é o menos importante, sobretudo diante das razões que justificam as
mudanças. O certo mesmo é o inevitável ceticismo acerca de um possível – e cada
vez menos improvável – aprendizado de Lula para os erros que ele próprio cometeu
até aqui.
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