Bolsonaro não consegue conviver com os contrapesos da
democracia
Em julho do ano passado, Janaina Paschoal incomodou os
apoiadores de Jair Bolsonaro. Convidada para discursar na convenção do PSL, a
advogada alertou que os seguidores do então pré-candidato tinham “uma ânsia de
ouvir um discurso inteiramente uniformizado”. “Pessoas só são aceitas quando
pensam exatamente as mesmas coisas”, completou, em tom de crítica.
Os desentendimentos em torno dos protestos do próximo dia 26mostram
que o bolsonarismo continua sofrendo desse mal. Os aliados mais devotados do
presidente estimulam o fanatismo e afastam parte de sua própria base política.
Quem não bate continência a todo momento é tratado como inimigo.
Nos últimos dias, a líder do governo, Joice Hasselmann
(PSL), tentou levantar uma bandeira branca na cruzada insana de Bolsonaro
contra o Congresso e disse que as manifestações seriam um “tiro no pé”. Recebeu
ataques nas redes e foi criticada até por deputados de seu partido.
Grupos de direita que se recusaram a aderir aos protestos
com nuances golpistas também entraram na lista de traidores. O MBL e o Vem pra
Rua se recusaram a emprestar suas marcas aos atos de domingo. “O movimento
liberal não compactua nem com o fechamento do Congresso nem com o fechamento do
Supremo”, disse Kim Kataguiri (DEM). Ele passou a ser chamado de comunista.
Sobraram na linha de frente das manifestações apenas as
facções mais raivosas do bolsonarismo, que investem contra o Judiciário e
contra os parlamentares de modo geral.
Janaina precisou voltar à cena. “Essas manifestações não têm
racionalidade. O presidente foi eleito para governar nas regras democráticas.
Propositalmente, ele está confundindo discussões democráticas com toma lá dá
cá”, escreveu. Foi acusada de sabotar os protestos.
Bolsonaro fez uma jogada de risco ao incentivar as
manifestações. Talvez as desavenças internas não rachem de vez seu núcleo de
apoiadores, mas já alimentam um clima de desconfiança mútua.
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