No início de uma recessão o governo deixará as empresas
reduzirem até 70% dos salários ou suspenderem o contrato de trabalho do
empregado e define isso como “o maior programa de emprego do Brasil”, como
informou o Ministério da Economia. Era isso ou uma onda de demissões, disseram
os secretários do Ministério. O presidente Jair Bolsonaro levou 48 horas para
sancionar a MP de auxílio aos mais vulneráveis, mas precisou de apenas oito
horas para derrubar a esperança de que tivesse enfim entendido a gravidade da
crise. Na noite da terça-feira, ele elevou a “gripezinha” à categoria de “maior
desafio da nossa geração”, mas de manhã postou em suas redes um vídeo com cenas
falsas de desabastecimento e acusando governadores. De tarde, fez uma reunião
com médicos para discutir a pandemia sem o conhecimento, e a presença, do
ministro da Saúde.
O Brasil enfrenta uma pandemia e tem o presidente Jair
Bolsonaro. Ele atormenta o país em vez de o administrar. Foi um alívio ouvir a
ministra Tereza Cristina com seu tom calmo de sempre falar o oposto do que fora
dito no vídeo falso que o presidente postou nas suas redes sociais logo cedo.
Ela afastou “qualquer notícia de que está faltando alimento”. Ou o ministro
Luiz Mandetta explicar mais uma vez que manterá o “foco” em vez de se preocupar
com a reunião para a qual ele não foi convidado, nem recomendaria nesse
momento.
Na economia, o presidente e o ministro Paulo Guedes
anunciaram com pompas e circunstâncias medidas já anunciadas com pompas em
outras circunstâncias. E até agora não implementadas. Elas foram detalhadas de
tarde pela sua equipe. Guedes, no esforço de mostrar que o governo tem feito
muito, costuma empilhar gastos de natureza diferente que confundem até sua
equipe de comunicação.
Ontem, ela chegou a publicar que as medidas eram de 2,6% do
PIB ou R$ 750 bilhões. Como se sabe 2,6% é em torno de R$ 190 bilhões e R$ 750
bilhões é 10,4% do PIB. Há muitas confusões que o governo tem feito: anuncia
várias vezes a mesma medida, dá como realizado o que ainda não saiu do papel,
mistura um dinheiro real, como o do auxílio que será pago aos informais, com
medidas regulatórias do Banco Central que aumentam apenas o dinheiro disponível
para os bancos.
A vida real está bem difícil. O governo não tem ideia de
como vai encurtar o caminho até os informais. E nem tornou realidade o
empréstimo a ser dado para pequenas e médias empresas para pagar o salário, com
dinheiro do Tesouro e dos bancos, que já havia sido apresentado no Palácio do
Planalto na última sexta-feira.
De novidade, o Ministério da Economia apresentou ontem o que
ele chamou de “programa emergencial de emprego e renda”. Segundo o secretário
Bruno Bianco, o plano “protege e tutela” o empregado e as empresas na crise.
A proteção é a seguinte: o empregador pode fazer acordos
individuais ou coletivos de redução de 25%, 50% e 70% nos salários, com
diminuição da jornada. O governo pagará o mesmo percentual reduzido, mas não do
salário, e sim do seguro-desemprego. Então, excetuando-se quem ganha salário
mínimo, os outros trabalhadores do setor formal poderão ter forte arrocho em
seus salários. As empresas poderão também suspender os contratos de trabalho
mas terão que pagar 30% dos salários a título indenizatório. Em compensação,
segundo os técnicos do Ministério da Economia, os empregos estarão
temporariamente mantidos até a travessia do pior da crise. Quem aceitar essa
ajuda do governo não poderá demitir pelo tempo equivalente ao que o salário foi
reduzido ou o contrato suspenso. Resta a dúvida: e se a empresa mesmo assim não
conseguir sobreviver, como manterá o emprego?
As empresas terão outros alívios. As pequenas e médias
poderão adiar o pagamento de vários impostos e contribuições. Isso realmente
vai aliviar muito. Deixarão de pagar por uns meses PIS-Pasep, Cofins e
contribuição patronal para a Previdência. Outra boa medida será a desoneração
completa do IOF nas operações de crédito, o que reduzirá os juros nos
empréstimos.
A proposta para a proteção do emprego vai na verdade reduzir
muito a renda e, portanto, o consumo, mais do que já está sendo reduzido com o
isolamento. É medida dura que vai aprofundar a recessão. E a boa ideia do
auxílio aos informais, que pode mitigar o efeito da crise, o governo ainda não
tem ideia de como vai implementar.
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