Maduro no dia 10; Trump, no dia 20. São datas diferentes de
posse e eles estão longe um do outro. No entanto é possível esperar dias tensos
no Sul.
Trump quer anexar o Canadá, tomar o
Canal do Panamá e
comprar a Groenlândia.
Certamente, estará muito ocupado nos primeiros momentos. Nos discursos de
campanha, ele mencionou algumas vezes a Venezuela:
— Estão nos mandando presidiários e delinquentes.
Ao que tudo indica, isentou os venezuelanos da prática de
matar e comer gatos e cachorros em Springfield. Essa acusação acabou pesando
contra os haitianos.
Depois de se eleger no tapetão, escondendo as atas, Nicolás
Maduro vive um certo isolamento. Seu adversário nas eleições, Edmundo
González, foi recebido na Argentina,
no Uruguai e
por Joe
Biden, nos Estados Unidos.
Só na semana da posse, Maduro rompeu com o Paraguai, e
o Chile retirou
o embaixador em Caracas: está
cada vez mais só.
Toda a tensão entre Estados Unidos e Venezuela acabará
repercutindo no Brasil. No passado, Bolsonaro simplesmente replicava a posição
de Trump. Lula sempre se dispôs a mediar. No entanto as relações entre Maduro e
Lula esfriaram precisamente porque o venezuelano não teve condições de
demonstrar que venceu as eleições. Apesar da boa vontade, não deu para passar
pano.
O Brasil não ignorará a nova situação porque a Venezuela
está muito perto. Temos mais de 400 mil refugiados venezuelanos em nosso
território. Certamente, o número crescerá à medida que o novo mandato de Maduro
vá se tornando uma realidade.
Maduro quer anexar Essequibo, região da Guiana rica em
petróleo. O Brasil tem condições de evitar que a Venezuela invada a Guiana por
terra. Nossas forças em Pacaraima (RR),
fronteira com a Venezuela, e Bonfim (RR),
com a Guiana, estão prontas para qualquer emergência. Tive a oportunidade de
visitar os dois quartéis e observar que, além de seu equipamento, distam
minutos de voo de Boa Vista, sede da 1ª Brigada de Infantaria de Selva.
Além dessa questão, há os ianomâmis, que vivem entre Brasil
e Venezuela. Temos feito um grande esforço para protegê-los do garimpo ilegal.
De que adianta tudo isso, se não há o mesmo empenho do lado de lá? Às vezes, os
ianomâmis andam nove dias na floresta para alcançar a área brasileira onde
recebem tratamento médico.
Todas essas implicações — sem falar na compra de energia e
mesmo no compartilhamento do monumental Monte Roraima —fazem
com que o Brasil não possa ignorar o destino da Venezuela.
Sei que não cai bem falar de algo que ainda não aconteceu,
num país como o nosso, cheio de problemas urgentes. Mas a posse das duas
figuras indica problemas à vista.
O que será mais discutido nas relações Brasil-Estados
Unidos, certamente, é o caso das plataformas digitais, que se alinham a Trump.
Primeiro foi o X, agora a Meta. Ambos com o
discurso de liberdade de expressão absoluta. Já escrevemos demais sobre isso. O
Brasil e parte da Europa têm uma concepção diferente da americana. Será preciso
respeitar as características nacionais.
O Congresso brasileiro até o momento decidiu não legislar
sobre o tema. O Supremo está julgando casos que podem ser decisivos para a
posição nacional.
Talvez o momento seja de reabrir uma grande discussão sobre
o modelo que o Brasil pretende implantar. O combate às fake news envolve uma
série de boas causas, como a proteção de direitos individuais, o cuidado com as
crianças, o respeito à democracia.
No entanto a bandeira da liberdade de expressão tem um
grande apelo. Não será um caminho fácil. O ano começa quente. E por falar em
temperatura, também aí não será um caminho fácil. Às vezes, as mudanças
climáticas entram no limbo, e os primeiros eventos extremos as recolocam na
agenda. Tantos prefeitos e vereadores novos… Deus queira que se deem conta do
mundo mudado.
A ONU tem
acentuado que a seca é o novo normal. Nos últimos três anos, mais de 30 países
já declararam emergência por causa da seca, inclusive alguns de alta renda,
como Estados Unidos, Canadá e Espanha.
Artigo publicado no jornal O Globo em 13 / 01 / 2025
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