Isso se aplica ao momento presente da escuridão que nos
segue desde a formação moderna do país
Velhice aqui pautada não é o amadurecimento biológico; é
o fato institucional sem a necessária renovação existencial
Diz um provérbio russo que peixe começa a feder a partir da
cabeça ("ryba is galovy gniot", para conferência dos cultores da
língua). Como em todo provérbio, há um jogo entre a significação aparente e o
sentido oculto. Isso se aplica ao momento presente da escuridão que nos segue
desde a formação moderna do país: o julgamento de generais, almirante e oficiais menores não é
só fato inédito nas Forças, mas também atestado de velhice de uma casta,
entranhada como um alien nas vísceras da República.
Refletindo sobre a idade avançada em seu
"De Senectute — o tempo da memória", o pensador italiano Norberto
Bobbio relata um lamento ponderado de idosos:
"Não é que a velhice seja ruim, o problema é que dura pouco". Bobbio
pergunta-se "será mesmo que dura pouco?" E contrapõe um verso de
Dario Bellezza: "Fugaz é a juventude/ um suspiro a maturidade/ avança
terrível a velhice/ e dura uma eternidade".
É que o pensador também rumina sobre os artifícios que tanto
prolongam a vida quanto impedem de morrer. A decrepitude pode estender-se como um fardo. "Ao lado da velhice
censitária ou cronológica e da velhice burocrática, existe também a velhice
psicológica ou subjetiva". As duas últimas coexistem em aspectos grotescos
da política, como o dos parlamentares vitalícios, maldosamente comentados na
imprensa: "Era lindo ver o triste desfile dos senadores vitalícios, cada
um mais cadavérico que o outro; uma velha Itália que ninguém quer mais e que
sozinha sepultou a si mesma" (Pietro Buscaroli, musicólogo). E mais:
"Velhos, mas podres de tanto veneno e rancor, sobras ilícitas e
condenáveis do regime das bombas e das tangentes".
Como no aforismo do peixe, há outro sentido nessas
referências italianas. "Velhice", última fase da vida", diz
Bobbio, "exprime um ciclo que se avizinha do fim. Por isso, ela é também
empregada metaforicamente para assinalar a decadência de uma civilização, de um
povo, de uma cidade". Mesmo citando clássicos, como Cícero, que fazem
apologia da sabedoria da idade, ele sustenta: "quem louva a velhice não a
viu de perto". Notícias
recentes de Trump o reportam cochilando acordado ou preocupado apenas
em aumentar seu nababesco salão de baile dourado em construção.
Mas a velhice aqui pautada não é o natural amadurecimento biológico. É principalmente o fato
institucional sem a necessária renovação existencial. É o que faz do
bicentenário Parlamento nacional exemplo de decrepitude. E nos golpistas, peixes grandes condenados, não carece ver
de perto sinais de doença física e mental. Por mais distantes, exibem não
senioridade, mas uma velhice pesada tanto para si mesmos quanto para outros.
Para si, porque contemplam um futuro despido das patentes e
medalhas que lhe fazem a glória pessoal. Para outros, efeitos cansativos da
vontade de eternizar-se de uma casta que se arroga a tutela da República,
desatenta à sua própria degeneração. Dado o estado dessas cabeças, é hora de
pensar também com o nariz.


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